sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

"Não sei porque mulher gosta tanto de farda" "Tem na casa da gente, tem um irmão que é homossexual, tem outro que é ladrão"

"Não sei porque mulher gosta tanto de farda" "Tem na casa da gente, tem um irmão que é homossexual, tem outro que é ladrão"

Ele pediu demissão, colocou o cargo a disposição, o governador Eduardo Campos aceitou. Por que o senhor governador esperou o pedido? Tudo para reafirmar a homofobia e o machismo institucionalizado. 

O governador deveria ter demitido, sumariamente, assim que leu ou soube das declarações machistas e homofóbicas. Como sempre tudo fica com cara de arrependimento.

`Não sei por que mulher gosta tanto de farda´, afirma secretário de Defesa Social, Wilson Damázio

Foto: Rodrigo Lôbo/JC Imagem

Por Fabiana Moraes, do Jornal do Commercio desta quinta (19)

O secretário de Defesa Social do Estado, Wilson Damázio, parecia alarmado: na entrevista concedida no dia 22 de novembro, uma manhã de sexta-feira, me recebeu acompanhado pelo corregedor-adjunto Paulo Fernando Barbosa, pelo ouvidor da SDS, Thomas Edison Xavier Leite de Oliveira, e, finalmente, pela gerente do Centro Integrado de Comunicação, Ana Paula Alvares Cysneiros. Estava, em parte, a par do assunto que seria tratado: o abuso sexual de policiais sobre jovens que vinham sendo acompanhadas há semanas, entre elas, duas menores.
Para a sua assessoria, informei que se tratavam de abordagens criminosas de policiais do Grupo de Ações Táticas Itinerantes (Gati), da Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicleta (Rocam) e da Patrulha do Bairro. Foi justamente a menção do mais "novo" projeto de segurança do governo estadual relançado ano passado (a primeira experiência aconteceu nos anos 80, gestão de Roberto Magalhães) que causou assombro desde o início. Faz sentido: a Patrulha do Bairro é a menina dos olhos da SDS e, por tabela, do governo Eduardo Campos.
De acordo com dados da pasta, o projeto reduziu em 21% os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) no segundo semestre de 2012 (na capital). Em Pernambuco, no primeiro semestre de 2013, foram menos 7% de homicídios. A meta do programa Pacto pela Vida era de 12%, mas os números são bem-vindos.

Assim, enquanto a Rocam e o Gati (campeão de registros na Corregedoria) já são velhos conhecidos da SDS quando os tópicos são denúncias e reclamações, a Patrulha, até então, figurava como estrela brilhante e inquestionável. No entanto, como foi dito no início desta série de reportagens que termina hoje, foram vários os relatos, de diferentes pessoas, de práticas abusivas da Patrulha na Rua da Mangabeira/Alto José do Pinho (também na Tamarineira).
José, o homem que apanhou sete vezes em sua própria rua, sempre chegava perto quando eu ia a mais um dos encontros com Carol, Patrícia e Stephanie. Na última vez que nos falamos (29 de novembro), dois dias depois de ser agredido novamente, ele disse: "A raiva tá guardada em mim. Eu não desconto em ninguém. Mas na próxima tapa que esses Robocop me derem, eu dou outra. Eu morro com dignidade e respeito. Vou ficar nesse lixo aí. Mas como indigente não", falou, apontando para o grande depósito de plástico, comida, móveis quebrados e dejetos diariamente colocados no fim da sua rua. O lixo que rodeia tudo. O lixo do canal, o lixo que Carol joga na rua, o lixo que todo um bairro joga sobre a casa sem banheiro da jovem grávida.

Não relatei a história durante a entrevista realizada no gabinete do secretário, que durou cerca de uma hora e meia e foi bastante amigável. No entanto, por duas vezes, ele sugeriu que eu poderia estar inventando as denúncias. Segundo Damázio, a veracidade das minhas palavras seria melhor considerada caso eu informasse os locais onde os policiais estavam cometendo os delitos, pois, a partir daí, a SDS poderia abrir um procedimento.
Traduzindo: eu deveria informar previamente ao chefe de segurança do governo estadual o cerne da reportagem que seria publicada apenas semanas depois. Educadamente, preferi não dizer nada. Não era o meu papel. Acredito que, desde domingo (15), quando a série começou a ser publicada, o delegado (com mais de 30 anos de carreira e cumprindo seu segundo mandato no governo Eduardo Campos) tenha passado a acreditar na realidade das meninas que circulam pelo Matagal. Pessoalmente, não duvidei em nenhum momento do tipo de coisa que acontecia ali.
Seria um interessante caso de criação ficcional coletiva, já que o lamentável comportamento da polícia foi relatado por pessoas das mais variadas idades e trajetórias. A conversa foi gravada em dois arquivos, um de seis minutos, outro de 51. Uma parte importante não foi registrada - o telefone tocou e interrompeu a captação, só retomada 30 minutos depois. Assim, nenhuma palavra dita durante o tempo em que o gravador não funcionou foi escrita aqui. Está publicado apenas aquilo que se pode provar.

JC - Estou há cerca de dois meses ouvindo relatos a respeito da questão da exploração sexual, a matéria tem relação com o livro Casa-grande & senzala. Estamos fazendo um paralelo, mostrando que o sofrimento de meninas e mulheres naquele momento não se extinguiu nos dias de hoje. Entre as falas, algumas feitas por menores, há relatos sobre a atuação da Rocam, do Gati, da Patrulha do Bairro. Eles chegam ao local, dizem as entrevistadas, como se fossem fazer uma abordagem, mas, na verdade, os policiais pedem para ver os seios das meninas, há relatos de sexo oral. Falei com a corregedoria para ver se existem registros de casos assim e informaram que não.

WILSON DAMÁZIO - Tivemos um caso desses em Barra de Jangada (Jaboatão). Nós prendemos em flagrante um policial (interrompe a fala e dirige-se ao corregedor adjunto, Paulo Fernando). Eles já foram demitidos? Tem que ver lá. Anote aí, por favor, veja se aqueles dois policiais foram demitidos.

JC - Isso foi na viatura?

DAMÁZIO - Foi assim: a moça estava no bar, com homens, e tal... era ligada à prostituição... e aí chegou no posto para prestar uma queixa. Os policiais disseram tá bom, vamos levar. Chegando lá, o bar já estava fechado, não deu em nada o trabalho. Ela alega que eles a levaram para a beira do mar e lá um deles a obrigou a fazer sexo oral (em entrevista, a vítima, então com 28 anos, informou que o policial manteve uma arma apontada para sua cabeça). Ficamos sabendo, botamos a corregedoria atrás, prendemos a guarnição, pegamos por nosso sistema de rastreamento. E aí, eles foram presos. Quer dizer: desvio de conduta a gente tem em todo lugar. Tem na casa da gente, tem um irmão que é homossexual, tem outro que é ladrão, entendeu? Lógico que a homossexualidade não quer dizer bandidagem, mas foge ao padrão de comportamento da família brasileira tradicional. Então, em todo lugar tem alguma coisa errada, e a polícia... né? A linha em que a polícia anda, ela é muito tênue, não é?

JC - A patrulha está muito próxima da população. Nos bairros que têm maior índice de criminalidade, há algum tipo de preparação especial ou ela é homogênea para todas?

DAMÁZIO - A gente preparou os policiais dentro de sua capacitação, do seu curso de treinamento, nós colocamos um viés muito forte no policiamento comunitário. Tanto é que aqui no Recife, os 800 policiais que nós lançamos receberam treinamento diferenciado, todos foram trabalhar na Patrulha do Bairro. Um tenente-coronel acompanha todo o trabalho das patrulhas, aqui na polícia, na SDS, há uma central de monitoramento que segue todas as viaturas através de rastreamento. Paralelamente a isso, temos quase 800 câmeras de monitoramento, algumas nossas, outras particulares.

JC - Há mais de um ano que o Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente (DPCA), especializada em crimes contra menores, não realiza rondas. Elas foram substituídas pela Patrulha do Bairro?

DAMÁZIO - Os PJES (Programa de Jornada Extra de Segurança) dessas rondas foram alocados para a Patrulha do Bairro, na RMR. Esse trabalho que era feito pela DPCA está sendo feito hoje pela Patrulha do Bairro. Mas nós fazemos também a Operação Sossego, operações especiais direcionadas a tudo isso... ao som alto, ao problema dos menores. Para o delegado da especializada, é fácil dizer "não estamos fazendo ronda porque não temos mais PJES". Mas eu lhe pergunto: se você é uma delegada de menores, se você tem uma área para cuidar, tem seu efetivo, custa pegar um policial de cada plantão e no sábado ou no domingo fazer um trabalho desses? Ele pode dizer que não tem mais o dinheiro do PJES para pagar, mas ele pode dar folga, uai. Se o policial trabalhou no domingo, ele folga na segunda.

JC - Só para entender melhor: o senhor falou na Operação Sossego, que inclui desde ação para coibir som alto até abordagem de menores. Mas são coisas muito díspares, totalmente diferentes.

DAMÁZIO -
 Não é não. Se você entra em um bar, tem um bocado de menor tomando cerveja lá. É carro com porta aberta, é isso, é aquilo. Então, a gente vai lá e faz as duas coisas, entendeu? Porque essa operação da DPCA era uma espécie de Operação Sossego, porque via o problema dos menores, de drogas, de bebidas em lugares incompatíveis com a idade. Aí a gente vê também a parte do som alto, porque o sossego é tudo, é tudo.

JC - E quando o Gati ou a Patrulha apreendem um maior explorando sexualmente uma menor, qual o procedimento?
DAMÁZIO - Leva todos juntos para a DPCA. Agora, esse crime de exploração sexual requer uma investigação maior, porque tem quadrilhas especializada nisso.

JC - E há uma vulnerabilidade maior das meninas por conta do crack, da própria dependência do crack.
DAMÁZIO - O governo está cercando de todos os lados. Antigamente tudo era com a Segurança Pública. Não tinha prefeitura, não tinha União. Ninguém se metia. Por isso o Estado investe tanto em escolas integrais. É a grande sacada. Esses meninos passando o dia todo na escola é show. Por isso investimos tanto no Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência). Sabe quem faz isso? A Polícia Militar de Pernambuco. Este ano nós já vamos com 60 mil capacitações de crianças e jovens. A gente faz no Estado todo, o jovem fica com a gente, ele faz o cursinho com a gente, acho que é 40 horas, onde ele vai aprender a resistir às drogas. Sabe aquelas meninas que ficam ali no manguezal da Ponte do Limoeiro (conhecido local de prostituição e exploração sexual)? Nós estamos empregando meninas dali aqui na SDS. Trabalham com limpeza, conservação. Se ela tiver um conhecimento a mais, trabalha com digitação... primeiro tratamos o problema da droga, depois elas vêm trabalhar aqui.

JC - E como é a desintoxicação dessas meninas?

DAMÁZIO - Através de tratamento. É um doente químico.

JC - Que atualmente a igreja vem em grande parte realizando...

DAMÁZIO - Mas nós temos o Cras, tem o Atitude, que atua em três níveis, na casa, na rua e o tratamento intensivo, para o cara que está com alto grau de drogadição. Faz tratamento mesmo. Pra ser reinserido. A gente quer que a pessoa mesmo se resolva, queira ser alguém. Muitos abandonas as casas. Infelizmente, desses muitos morrem.

JC - Onde são os centros de recuperação do Estado?

DAMÁZIO - 
A gente aqui no Recife... é... tem que ver com Daniel... mas nós vamos botar em outras cidades. Mas, voltando para a Patrulha do Bairro, se a gente souber, vai pra cima pra armar um flagrante. E não é só policial que se envolve com isso. Já pegamos até carro da prefeitura (do Recife) ali perto da Escola Soares Dutra (Santo Amaro). Eram duas horas da tarde... um senhor, 60 anos, sentado na Kombi e uma menina fazendo sexo oral nele. Era um carro que trabalhava para a prefeitura. Foi demitido e foi preso. Eu fiquei indignado. A gente não alisa. A gente não é conivente. Aquela época do falso corporativismo acabou.

JC - Isso me recorda o escândalo da Ronda do Quarteirão, no Ceará (programa semelhante ao Patrulha do Bairro), quando as câmeras dos próprios veículos filmaram os policiais fazendo sexo com mulheres dentro dos carros.

DAMÁZIO - A gente já pensou em colocar a câmera escondida, mas aqui agora tudo é garantia e direitos individuais..

JC - Mas o carro é público, eles estão a trabalho, acho que não haveria essa questão.

DAMÁZIO -
 Ah, vai dizer isso para as associações... aqui tem muitos problemas , com mulheres, principalmente... Elas às vezes até se acham porque estão com policial. O policial exerce um fascínio no dito sexo frágil.. Eu não sei por que é que mulher gosta tanto de farda. Todo policial militar mais antigo tem duas famílias, tem uma amante, duas. É um negocio. Eu sou policial federal, feio pra c**.. a gente ia pra Floresta (Sertão), para esses lugares. Quando chegávamos lá, colocávamos o colete, as meninas ficavam tudo sassaricadas. Às vezes tinham namorado, às vezes eram mulheres casadas. Pra ela é o máximo tá dando pra um policial. Dentro da viatura, então, o fetiche vai lá em cima, é coisa de doido.

Agradecimentos (1) e uma última história (2): Obrigada a Carol, Stephanie, Patrícia, Bianca, Fábio, Silvana, José e família, João Villacorta, DPCA, Fazenda Esperança, Maria Lacerda, Fundação Joaquim Nabuco e equipe do Engenho Massangana. Agradecimento especial a Felipe, que estava nas barreiras da Mangabeira na primeira vez que fui ao local. De longe, o vi com um amigo. Senti medo, achei que poderia ser assaltada. Decidi ir em frente. Ao chegar perto, ele me abordou. "Tu é da polícia?" "Não." "Tu conhece quem aqui?" Falei que procurava por Carol e que ia conhecer Bianca. "Ela tá internada, né? Ela tá bem?" Disse a Felipe que sim, que ela havia se recuperado do crack (vinha da casa de sua mãe, Silvana, que me mostrou uma foto da menina já saudável). Felipe me perguntou se o lugar onde Bianca estava também atendia homens e eu disse que não. Ele ficou calado por um momento e depois falou: "Tu me ajuda?"

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