sábado, 25 de outubro de 2014

Protejam nossas crianças, não as exterminem. A pureza infantil ainda pode salvar o mundo

Protejam nossas crianças, não as exterminem. A pureza infantil ainda pode salvar o mundo

pureza

Por Thiago M. Minagé e Juliana D. Vieira - Justificando


Enfim, que nosso querer, seja comum mesmo que diferente, pois a diferença nos completa e faz com que sejamos iguais pela nossa própria diferença, agimos e falamos de forma igual, porém nem sempre queremos a mesma coisa, mas certamente a satisfação do querer é comum. Por isso, falar com respeito e amor, certamente não atenderá o que todos querem, mas alcançará a satisfação e atendimento daquilo que todos desejam: ser tratado com respeito e amor.[1]

Dando continuidade e aperfeiçoando o pensamento lançado por juristas comprometidos com o Direito em sua essência iniciamos o texto com o que na semana passada Salah H. Khaled escreveu: Considerando a inegável seletividade de nosso sistema penal, estaremos autorizando a criminalização massiva de jovens negros e pobres, que serão posteriormente adestrados e integrados a maquinarias privadas de produção, sem qualquer necessidade de respeito a direitos trabalhistas. Presídios privados geram uma demanda por presos: pessoas se transformam em objetos que podem ser consumidos no processo de produção do que não consomem, como se escravos fossem[2].
Época de eleições, debates, santinhos, horário político, placas de candidatos em todos os lugares, candidatos apresentando suas propostas, até aí tudo normal, se não fosse o caso de uma proposta em particular de um candidato a presidência a respeito da redução da maioridade penal para crimes hediondos! Oi?
Algumas semanas atrás onde o enfoque era o discurso, foi dito: Ocorre que, o uso indiscriminado e rotineiro de fundamentações que usam expressões com meros apelos retóricos, incitação ao ódio, principalmente de forma fundamentalista, é cada vez mais comum e viola cada vez mais, direitos e garantias constitucionais conquistadas por nossa sociedade em verdadeira afronta ao Estado Democrático de Direito[3].
Se o intuito dessa proposta era ganhar votos, parabéns! O discurso do ódio consegue seus adeptos. Agora, se isso for a sua proposta para diminuir a impunidade e violência no país, está fazendo isso errado, começando pelo fim. Tem que tratar a causa e não o efeito. Precisamos cumprir com o que está previsto na constituição e não alterar ou aumentar mais ainda o código penal. Até porque não adianta nada ter leis se não são cumpridas. Enfim, não vamos entrar no mérito da legislação mal aplicada.
E quais são as causas de o Brasil ter a 4ª maior população carcerária do mundo, e de ter 70% de reincidência nas prisões de todo o país?
A base, educação, em um país onde educação é para poucos, e não estou falando só da educação na escola, e sim aquela que se aprende em casa, que é primordial e na maioria das vezes é o fator mais importante para a criminalidade, vulgo ‘jeitinho brasileiro’, se a criança é ensinada desde pequena a furar fila, copiar a tarefa do colega, mentir para os pais, a tendência é que ela cresça fazendo cada vez pior. Sem falar na educação das escolas, falta de estrutura, professor mal remunerado, não tem motivação para dar aula, consequentemente, o aluno de escola pública, sem condições de aprender, e sem incentivo algum, vê um lado mais fácil e rápido de ganhar dinheiro, não precisa estudar, prefere correr o risco, já viu, com as outras pessoas que passaram pela mesma coisa que ele, e logo foram soltos, e também se for preso, a realidade dentro da cadeia não é muito diferente da que ele tem. Sem a educação adequada, os pobres são excluídos de se tornarem cidadãos, e encarcerar os mesmos é só um modo de assumir a incompetência do estado de não garantir esse direito básico.
Desigualdade social, precisa comparar as chances de uma criança que nasce na favela, sendo afilhada de traficante, vendo o padrinho como um herói, um azimute, sem saneamento básico, vivendo em um mundo paralelo sem as mesmas condições, mas que almeja os mesmos resultados que alguém com oportunidades, (que já nasce em uma família estruturada, frequenta as melhores escolhas, tem tudo na mão, sem motivo algum para procurar a violência ou um caminho alternativo pra ter um futuro próspero), e influenciado pela sociedade capitalista e consumista, onde o ter vale mais do que o ser, tenta um caminho alternativo para conseguir o que quer.
Como já dito outrora: Acabar com a criminalidade deve começar com uma estruturação social competente, educando nossas crianças, possibilitando inclusão social aos mais necessitados e não limitando os direitos inerentes às pessoas de forma ilegal e arbitrária. Ao contrário do ódio implantado de uma classe em face da outra, deveríamos aproximá-las, integra-las, ensinar a respeitar ao invés de criticar, implantar a tolerância em detrimento da intolerância, substituir o discurso do ódio pelo respeito ao ser humano.
Já é previsto na legislação brasileira, no ECA, as sanções para maiores de 12 anos e menores de 18, com medidas socioeducativas como, advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, e são aplicadas de acordo com a gravidade da infração, as circunstâncias do fato e a capacidade de cumpri-la.
As medidas socioeducativas têm como objetivo ajudar o jovem a ressocializar, recomeçar, é um modo de aprendizado para que ele não volte a repetir o fato, e pelo índice de reincidência de 20%. Pode-se notar que é muito mais fácil de recuperar um menor infrator.
Não existe no Brasil intenção alguma de recuperar os detentos muito menos uma política penitenciaria, é muito mais fácil jogar todos aqueles excluídos da sociedade em jaulas, e deixar se tornarem bichos, até voltar pra sociedade e influenciar outras pessoas, praticar outros crimes, já que não conseguiram um emprego decente, e precisam sobreviver de alguma forma.
E mesmo que todos esses motivos fossem superados, com o sistema carcerário falido e superlotado com 500 mil presos, não temos suporte para mais presos, como já dito a cima, só ficamos atrás dos EUA (2,2 milhões), China (1,6 milhões) e Rússia (740 mil).
Usando a analogia para esse caso, a UNICEF divulgou a experiência mal sucedida dos Estados Unidos em que aplicou nos adolescentes as penas previstas aos adultos, resultado? Os jovens saíram da penitenciaria e voltaram a cometer crimes, só que dessa vez de forma mais violenta.
Resumindo, não vai adiantar reduzir a maioridade penal para 16 anos, quando quem alicia esses menores tem uma demanda enorme de crianças e adolescentes com menos de 16 anos, e isso se torna um ciclo vicioso, o menor que agora já pode ser preso (considerando que a maioridade penal seja aprovada) vai para a prisão, que já está lotada, podre, sem condições de higiene alguma, lá ele aprende mais do código penal que um estudante de direito no ultimo ano da faculdade, tem um mestrado em criminalidade, e volta pra sociedade, muito pior como pessoa e muito melhor como marginal, pronto pra outra, a única diferença será que ele vai começar esse ciclo mais cedo, não só ele, como muitos, e poderemos passar de quarto lugar de população carcerária, para terceiro, ou segundo, pois a marginalidade não vai diminuir. Não se tem dados que comprovem a eficácia da redução da maioridade penal, muito pelo contrário, uma vez que o índice de reincidência nas penitenciarias é de 70% diferente das medidas socioeducativas, que contam com apenas 20%.
Assim, meros apelos retóricos discursivos, sem base, sem estrutura que o sustente não podem seduzir ao ponto de dominar o inconsciente coletivo na criação do “inimigo” que tanto nos assusta e por conta disso nos faz crer que o melhor caminho é eliminá-lo a qualquer custo. Friedrich Nietzsche[4] a muito já nos alertava Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você.

Thiago M. Minagé é Doutorando em Direito pela UNESA/RJ; Mestre em Direito Pela UNESA/RJ, Especialista em Penal e Processo Penal pela UGF/RJ, Professor da Pós Lato Sensu da UCAM/RJ, de Penal e Processo Penal da UNESA/RJ, Coordenador da Pós Graduação Lato Sensu em Penal e Processo Penal da UNESA/RJ e da graduação da UNESA/RJ unidade West Shopping; Professor visitante da EMERJ (Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro), Membro da AIDP – Associação Internacional de Direito Penal e Autor da obra: Prisões e Medidas Cautelares à Luz da Constituição – publicado pela Lumen Juris. thiagominage@hotmail.com

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