sexta-feira, 27 de maio de 2011

Procuram-se empregadas domésticas

Procuram-se empregadas domésticas

Aumento da escolaridade, desemprego menor e crescimento da classe C reduzem número de empregadas, que também passam a ganhar mais
Klinger Portella, iG São Paulo

Marinete da Silva trocou as diárias pela carteira assinada

Recentemente, o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto comparou empregadas domésticas a animais em extinção. "Quem teve esse animal, teve. Quem não teve nunca mais vai ter", afirmou o ministro, que depois pediu desculpas pela frase. Força da expressão à parte, a diminuição do número de profissionais do rodo e a vassoura é real. O aquecimento da economia promoveu, ao mesmo tempo, o aumento de escolaridade, o aquecimento no mercado de trabalho e o crescimento da classe C - que também passou a poder pagar pelo trabalho das domésticas. Combinados, os fatores têm feito com que domésticas, babás, cuidadoras, faxineiras, cozinheiras e passadeiras não fiquem desempregadas um dia sequer, caso queiram.

Há três semanas, por exemplo, a dona de casa Lúcia Souza enfrenta sozinha as tarefas do lar. Sua empregada teve um problema de saúde e precisou deixar o serviço. “Até chorei”, diz ela. A dificuldade maior, explica a dona de casa, é encontrar uma pessoa de confiança. “Ando meio ressabiada, porque uma começa e larga, vem outra e larga.”

Quando encontra a empregada ideal, o desafio é ainda maior. “Quando é ótima, vai embora, porque sempre tem alguém oferecendo mais dinheiro”, completa Lúcia, que paga R$ 70 por dia de faxina.

Serviço “inflacionado”

A dificuldade encontrada por Lúcia Souza pode ser observada nos números oficiais. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, em 2010, os trabalhadores domésticos representavam 7,6% de toda a população ocupada no País, o mesmo percentual observado em 2003.

Em algumas regiões, no entanto, houve queda no número de domésticas empregadas. É o caso da região metropolitana de São Paulo. De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE, a participação dessas mulheres no mercado de trabalho caiu 14% entre 2006 e 2010 . No mesmo período, o salário subiu 21%. No resto do país, a alta do salário das domésticas foi ainda maior. Em 2009, esses profissionais ganhavam, em média, R$ 662,94, crescimento de 24,5% frente ao observado em 2003. O percentual de expansão é 2,5 vezes maior que o da média da população ocupada com carteira assinada, cujos rendimentos saltaram 10% no período.

Apesar disso, o número de domésticos com carteira assinada continua alto. Entre 2003 e 2009, o percentual de trabalhadores formais no setor cresceu menos de 2 pontos percentuais, para 36,9% do total – contra 35,3% de 2003. Na média da população ocupada, o crescimento foi de cinco pontos percentuais.

Foi pelos benefícios da carteira assinada que Marinete da Silva deixou a rotina de diarista para trabalhar como auxiliar de serviços gerais na Nova Rio, empresa de terceirização de mão de obra. “Empregada doméstica tem carteira assinada, mas sem os benefícios que a empresa oferece, como PIS, seguro desemprego e tíquete alimentação.”

Com jornada de trabalho das 6h às 16h, de segunda à sexta-feira, Marinete ainda encontra tempo para completar a renda com faxinas extras. E lucra com a escassez de profissionais. “Meus sábados estão todos lotados”, diz ela, que cobra, em média, R$ 85 por faxina. “Dependendo da casa.”

Improviso

Com a escassez de profissionais no mercado, a solução para muitos casos é o improviso. A engenheira química Luciana Gitirana perdeu a babá de seu filho por um período de cinco meses por licença médica. Para ocupar a vaga temporária, no Rio de Janeiro, ela oferecia salário de R$ 950, mais vale transporte e benefícios.

Interessados não faltaram. Mas ela não encontrou a pessoa ideal para o posto. “As pessoas que vinham por indicação não tinham mais disponibilidade”, diz. “Para cuidar de criança, não ficamos testando.”

Para solucionar o problema, o caminho foi colocar a empregada doméstica no posto da babá e contratar uma diarista, que cobra R$ 90 por dia de faxina mais transporte. “Foi mais fácil encontrar a diarista e resolver o problema.”



Foto: Arquivo pessoal Ampliar
Sem encontrar profissional no mercado, Luciana precisou improvisar babá

Novas perspectivas

Um dos indicadores com maior transformação entre os trabalhadores domésticos é o nível de escolaridade. Segundo o IBGE, em 2003, 22,9% dos empregados não tinham instrução ou tinham menos de quatro anos de estudos. Em 2009, o percentual havia caído para 16,4%.

Já o número daqueles com mais de 11 anos de estudo saltou de 9,8%, em 2003, para 18,6% do total, seis anos mais tarde.

Foi apostando no estudo que a cabeleireira Rose Soares deixou a vida de diarista. Ela começou com as faxinas, em 1973, em uma casa de família na região central de São Paulo. Enquanto a criança da casa estava na escola, Rose fazia um curso de cabeleireiro. Depois que me formei, fui fazer o Mobral”, diz.

Sete anos depois, Rose deixou o trabalho como doméstica. Em 1985, já era dona do próprio negócio. Hoje, viu seus dois filhos formados com dinheiro do seu salão de beleza.

Aspecto social
Se o crescimento econômico tem proporcionado com que as pessoas tenham maior mobilidade profissional, outro fator pode fazer com que a oferta de empregadas domésticas não acompanhe a demanda pelos serviços: o preconceito social.

"Existe, socialmente falando, um olhar pejorativo para esse tipo de atividade”, diz a psicóloga Meiry Kamia, consultora organizacional. “Hoje, falar que trabalha como doméstica tem menos status que trabalhar em um telemarketing, por exemplo, mesmo com as domésticas ganhando até mais que as atendentes de telemarketing”, compara.

Na comparação entre status e dinheiro, o primeiro prevalece, diz Meiry. “O dinheiro está entre os fatores motivadores mais baixos. Antes disso, está a questão do reconhecimento e a possibilidade de crescimento profissional.”


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