Entrevista com Claudio Picazio: “Homossexualidade não é uma opção”
Com quase 30 anos de experiência clínica, o especialista em sexualidade afirma que os pais devem encarar a homossexualidade sem preconceito ou culpa
O melhor caminho de combate ao preconceito sempre foi a informação. Especialista em sexualidade humana, Claudio Picazio é psicólogo clínico há quase 30 anos. Atende adolescentes, adultos e casais homossexuais e foi consultor do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação no projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE). Sua experiência se traduziu em três livros. O mais recente, “Uma outra verdade: Perguntas e respostas para pais e educadores sobre homossexualidade na adolescência” (Editora GLS), acaba de ser lançado.
Enquanto o tema volta aos holofotes com a recente agressão não explicada a três rapazes na avenida Paulista, em São Paulo, e a publicação de uma carta do reverendo Augustus Nicodemus Gomes Lopes, chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie, opondo-se à aprovação da lei que pretende criminalizar a homofobia, Claudio acredita que, com alguma dose de informação, o preconceito possa diminuir – e o papel dos pais é fundamental, seja amparando seus filhos gays, seja educando filhos heterossexuais para o fim do preconceito. Leia abaixo entrevista com o autor.
iG: Baseado na sua experiência, qual o erro mais comum que os pais ao descobrirem que o filho é gay?
Claudio Picazio: Se culpar pela homossexualidade dos filhos e culpar os filhos. Não tem culpado, nem inocente nessa história. Os filhos não são gays para torturar os pais. Tem alguns pais que se colocam nessa posição e tratam a situação com aversão e homofobia. Ser homossexual não é uma opção, ninguém escolhe, é escolhido. A gente percebe os nossos desejos. Os desejos hetero e homo são iguais. Ninguém sentou do lado de uma criança e falou “goste de meninos” ou “goste de meninas”.
iG: Como os pais podem lidar com a frustração que sentem ao se depararem com a sexualidade do filho?
Claudio Picazio: Não tem jeito, os pais vão ficar frustrados. Eles colocam expectativas nos filhos o tempo inteiro, é normal. Mas além das frustrações deles, eles podem observar que quem está frustrado, quem está muito mal é o filho. Alguns pais esquecem a sua função, que é de proteger, amparar os filhos. Ser pai é ajudar os seus filhos a crescer. Nessa história, quem está sentindo mais dor não são os pais. Mesmo assim, alguns ainda obrigam os filhos a entender a dor deles. E a dor desses jovens, quem entende? Os pais precisam passar por cima da frustração e perceber que quem mais precisa de apoio é o filho.
iG: O que um adolescente sente ao se descobrir homossexual? Como é a dor?
Claudio Picazio: A dor é única. É a dor de se sentir completamente errado. É como se o mundo estivesse dizendo para você que o que você sente é errado, que você é errado, que você está excluído da sua família. Como se a sua maneira de amar e de gostar é errada, e isso causa uma dor terrível. Imagina só o que você sentiria se o mundo dissesse que você não está autorizado a sentir atração por quem você sente – sendo que as relações amorosas são megavalorizadas? É isso que leva esses gays a se esconderem, a se trancarem no armário, a terem casamentos de fachada. O pior é que é uma dor cretina, que não precisava acontecer. É pura ignorância social.
iG: Qual a melhor maneira para lidar com a homossexualidade dos filhos?
Claudio Picazio: Os pais têm que dizer para esses filhos que entendem que a homossexualidade não é uma opção. E que entende que ele faz parte dos 10% da população. Tudo no mundo é criado para o heterossexual, por isso os pais precisam amparar esse filho. Para isso, os pais precisam se preparar, primeiramente, eliminando o preconceito interno, e depois, aprendendo sobre o assunto.
iG: Muitos pais “fingem que não veem”. Isso é pior para os filhos?
Claudio Picazio: Isso é péssimo. Quando não são vistas, as coisas tendem a ficar maiores e piores do que realmente são. Às vezes os pais se justificam, alegando que não comentam nem falam com os filhos sobre isso porque não querem invadir a vida do filho. Na verdade, não é invasão. Para o filho, isso pode aparentar um total desinteresse com a sua vida.
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iG: O que os pais podem fazer para que os filhos não sejam preconceituosos?
Claudio Picazio: Eles têm que bater na tecla de que a homossexualidade não é doença, não é desvio. Quando a criança começar com atitudes preconceituosas, os pais têm que coibir de imediato. Têm que falar que elas estão erradas. Agora, se os próprios pais fazem isso, se são preconceituosos com gays, fica difícil a criança aprender. Não é doença, não é desvio. Começa por aí. Tem um paciente meu, pré-adolescente, que fala o seguinte: todo mundo é passarinho. Tem sabiá, canarinho, eles são diferentes um do outro, mas são todos passarinhos. Não é estranho que os canarinhos queiram matar todos os sabiás porque se acham melhores?
iG: Há alguma diferença na maneira que as pessoas tratam a sexualidade de meninos e meninas?
Cláudio Picazio: A sexualidade feminina se apresenta de várias maneiras. Se uma menina não namora, tudo bem; se ela tem várias amigas, tudo bem; se ela andar apenas de camiseta e jeans, também tudo bem. As pessoas não ligam. Já a sexualidade masculina é única, se o cara não coçar o saco e não gostar de futebol, é bem capaz que seja considerado gay.
iG: E qual o papel da escola nesse contexto?
Claudio Picazio: A escola tem uma função básica. O professor é o agente que ajuda na socialização das crianças. A escola é onde as crianças convivem com todas as pessoas, fora da proteção da família. Ou seja, o professor tem que ser uma pessoa que ajudará todos a aprenderem a se respeitar. Se o professor também for preconceituoso, danou-se. Eles deveriam ajudar as pessoas a não se omitir, a se relacionarem melhor. Porém, a maioria deles se omite ou até tira sarro do homossexual. Usam de experiências pessoais ou religiosas para tentar alterar a ideia do adolescente, e isso é um erro enorme.
iG: Qual a sua opinião sobre o caso da carta do chanceler da Universidade Mackenzie ter feito uma carta contra a lei anti-homofobia?
Claudio Picazio: É um absurdo! Como é que um cara, com aquela posição em uma instituição de ensino pode falar aquilo? É misturar religião com educação, e a educação deveria ser laica. Ou seja, começou errado. Pelo que eles falam na carta, que todos têm que ser protegidos de maneira igual, o Estatuto do Menor, a Lei Maria da Penha deveriam ser derrubadas. Se as pessoas têm um preconceito, que guardem pra si. Agora, se eu acho que um menino é gay eu posso agredi-lo com uma lâmpada na cabeça e tudo bem? O que é isso?
Fonte: Portal iG
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segunda-feira, 6 de junho de 2011
“Homossexualidade não é uma opção”
Postado por
Maria,viajante do Universo de passagem pelo planeta Terra
às
14:51
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