Veja colocou a pá de cal
em sua decadente trajetória com a matéria publicada na última edição, na qual
se valeu de todos os métodos, inclusive criminosos, para corroborar uma de suas
teses, desta vez a de que o ex-ministro José Dirceu conspira contra o governo
de Dilma Rousseff.
A matéria não se
sustenta jornalisticamente, com uma série de ilações e conclusões frágeis,
porém o mais grave foi o seu método de apuração, com recurso à espionagem,
invasão de privacidade e outros delitos, o que levou seu repórter a ser
denunciado pelo hotel em que José
Dirceu estava hospedado por
tentativa de violação de domicílio. Para quem não leu a matéria ou o que já foi
escrito sobre ela, o repórter da Veja hospedou-se no mesmo hotel de Dirceu, em
Brasília, e tentou por duas vezes entrar no quarto do ex-ministro, primeiro
passando-se por hóspede do apartamento que tinha esquecido as chaves, e,
depois, por assessor da prefeitura de Varginha que fazia questão de deixar no
quarto "documentos relevantes".
O que pretendia o repórter
caso fosse bem sucedido em sua empreitada? Fuçar papéis e documentos do
investigado? Roubá-los caso encontrasse algo que fosse ao encontro da tese da
reportagem? Quem o orientou a agir dessa maneira? Seu chefe imediato, os
editores da revista, o dono da editora que a publica? As perguntas são muitas e
todas complicam ainda mais a situação de Veja e sua forma de fazer jornalismo.
A revista foi além e
publicou imagens gravadas no corredor do andar do hotel em que Dirceu se encontrava, que mostram o ex-ministro
com outras figuras da política brasileira. Veja não esclarece como obteve as
imagens, mas parece pouco provável que as tenha conseguido com o próprio hotel,
o que reforça as suspeitas de que tenha instalado algum equipamento por conta
própria, o que aumenta a gravidade do delito. Trata-se, primeiro, de um caso de
polícia. Depois, de grave atentado à ética jornalística.
A desfaçatez de Veja
impressiona ainda mais, pois ocorre pouco após o escândalo do comportamento
criminoso e, consequentemente, desprovido de ética do tablóide News of the
World, do império midiático de Rupert Murdoch, que espionava personagens da
vida pública inglesa como procedimento editorial assumido. O caso do jornal
londrino não só está fresco em nossa memória, como ainda ocupa os tribunais
ingleses, com jornalistas presos e respondendo a processos.
Há um bom tempo, Veja
perdeu credibilidade perante boa parte dos leitores com capacidade crítica e de
observadores do comportamento midiático. A recente reportagem pode ter sido o
passo final para sua sentença de morte. A revista semanal não deve ser extinta,
como o News of the World, mas tende a se tornar cada vez mais leitura ligeira
de sala de espera de consultórios médicos, sem o prestígio outrora desfrutado.
A matéria de Veja
colocou jornalistas e toda a imprensa perante a necessidade de responder à
sociedade sobre que tipo de ofício praticamos. Somos todos imprensa marrom? Não
temos limites nas nossas apurações? Vale tudo na busca de uma informação?
Compactuamos com este tipo de jornalismo? Creio que jornalistas, empresas
jornalísticas, sindicatos e associações precisam se manifestar claramente,
repudiando o procedimento da revista. Do contrário, nos locupletamos.
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