sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Não se faz um Lula todos os dias


Não se faz um Lula todos os dias

Selvino Heck 
Não se faz um Lula todos os dias. Não acontecem Lulas a qualquer hora. Todas e todos temos duzentas mil histórias sobre Lula. Por isso tudo, permitam-me um depoimento pessoal.
Conheci Lula no II Encontro da Articulação Nacionalde Movimentos Populares e Sindicais (Anampos), em Taboão da Serra, São Paulo, em 1981. Fomos eu, João Pedro Stédile, Walter Irber e Olívio Dutra, do Rio Grande do Sul. A Anampos reunia, ineditamente, dirigentes sindicais combativos, lideranças de movimentos populares urbanos e rurais e de pastorais, num esforço de diálogo  entre setores populares de luta que, em tempos de ditadura, faziam trabalho de base, vinham da luta social autêntica, da educação popular freireana e precisavam organizar-se nacionalmente. Estava surgindo o Partido dos Trabalhadores, e a partir das reflexões da Anampos surgiram a CUT e a Central de Movimentos Populares (CMP).
Mas na verdade conheci Lula antes, como morador da Lomba do Pinheiro. Organizamos um Fundo de Greve de apoio às greves dos metalúrgicos do ABC, fundamos um Núcleo de Base do PT e organizamos a Oposição Sindical dos trabalhadores da construção civil, à luz das lutas do ABC paulista.
Ao longo do tempo e da vida, nestes mais de trinta anos, foram inúmeros os contados. Por exemplo, os comícios das Diretas-Já, em Porto Alegre. Depois, deputado estadual constituinte, comi um churrasco num apartamento em Brasília, onde três constituintes moravam juntos: Lula, Olívio Dutra e o hoje senador Paulo Renato Paim. Ou a campanha de  Olívio Dutra prefeito, em 1988. Ou a memorável campanha de 1989, eu coordenador geral no Rio Grande do Sul, quando Lula fez 6% dos votos dos gaúchos no primeiro turno e, com apoio de Brizola, acachapantes 60 e tantos por cento no segundo. Ou no início dos anos 90, eu presidente do PT/RS levando  Lula e Olívio Dutra para os altos do morro Santa Teresa em Porto Alegre para uma entrevista, meu Passat velho quase não subindo o morro e Lula reclamando de como um partido que queria ser grande nem ao menos carro decente tinha. 
Por artes do destino, Frei Betto, assessor especial de Mobilização Social do presidente eleito, em 2002 convida sete educadores populares, entre eles eu, para ajudar na mobilização social e educação popular das famílias beneficiadas pelo Fome Zero. Frei Betto sai do governo e acabo assessor epecial do presidente por seis anos.
Lula tem pelo menos duas grandes virtudes que sempre me chamaram a atenção. 
Lula sempre soube ver na frente, antecipar-se aos fatos. Foi assim com as greves do ABC, em meio à ditadura, quando vislumbrou o enfraquecimento do regime, a possibilidade da abertura democrática, combinados com o empobrecimento dos trabalhadores. A partir da vivência, da prática e da realidade, enxergou o espaço para criar um partido dos trabalhadores. Ou a importância da formação política dos trabalhadores. O Sindicato dos Metalúrgicos sempre teve processos organizados de formação. Mais tarde, a criação do Instituto Cajamar, e depois do Instituto Cidadania. Assim foi a proposta do Fome Zero no início do seu governo, a aposta na candidatura Dilma, mulher, gestora competente. Ou, agora, ex-presidente, os olhos voltados para a América Latina e África. 
Lula sempre teve e demonstrou um amor entranhado, primeiro e preferencial, pelos pobres, pelos fracos e oprimidos. A falta de emprego e de salário, não ter comida para pôr na mesa, a fome sempre foram seu indicador maior, seu norte. São inúmeras as histórias quando dirigente sindical, dirigente político, presidente. Como quando, depois de insistência de seu chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho, cancelou todas as audiências para falar longamente com  os hansenianos, jamais atendidos por ninguém, muito menos por um chefe de governo. Ou dos catadores e moradores de rua, com quem se encontra todos os anos em São Paulo dias antes do Natal. 
Por isso, quando, na abertura da IV Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional em Salvador, Bahia, o presidente do Consea, Renato Maluf, e no encerramento o ministro Gilberto Carvalho mencionaram o nome de Lula, os mais de 2 mil delegados se levantaram e começaram a cantar emocionadamente o Lula-Lá de 89, que nunca mais esqueceram e nunca mais esquecerão.
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