quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Discussão sobre 'Lula no SUS' me envergonha, diz médica

Discussão sobre 'Lula no SUS' me envergonha, diz médica

O SUS, Lula e as redes sociais
Maria Falcão
É uma pena o rumo tomado pelas discussões em torno da polêmica gerada pelos posts no Facebook, sugerindo que o ex presidente trate sua doença pelo SUS. Mais uma vez, estamos perdendo a chance de uma discussão rica. Ficamos presos nos pontos, na minha opinião, secundários. O mais relevante, que seriam as críticas positivas e negativas ao nosso Sistema Público de Saúde, ficou perdido, sem vez em meio a um lamaçal podre de politicagem, rancor, pobreza de espírito e outras baixarias, de ambos os lados da discussão.
Assim dito, quero aqui propor uma limpeza nas apelações dos debates e dar a minha contribuição à polêmica, na ótica do que julgo ser relevante. E faço isso pensando nos vários e vários pacientes que chegam a mim com cânceres diversos e "intratáveis", simplesmente porque não conseguem fazer suas quimioterapias em tempo hábil. Aliás, escrevo esse artigo em homenagem a um paciente de 14 anos (e sua família), que faleceu com um tumor cerebral depois de nem sequer ter conseguido vencer a fila do único hospital oncológico vinculado ao SUS em Salvador.
Quando li os posts de linchamento (ou quase) de Lula, pouco me interessou saber quais eram as reais motivações de quem os criou: se fazer uma brincadeira, uma ironia, ou se desejavam mesmo o pior para Lula. Vi ali uma forma de protesto, até certo ponto compreensível, e ponto final. Mas aí vieram as respostas, com mensagens que pareciam colocar a sugestão do tratamento pelo SUS como uma sentença de morte. A elas, se seguiram textos de pessoas contando experiências de tratamentos bem sucedidos feitos na rede pública, relatos emocionados que até nos fazem pensar que é assim com todo mundo. Até a competência do INCA foi trazida para a discussão. Alguém, indignado, escreveu linhas em defesa da assistência prestada na instituição, dizendo ser exemplar. E é mesmo. Pena que para alguns poucos felizardos. Mas aqui há um erro de interpretação grosseiro: quem está questionando a competência do INCA? O que se questiona é a incapacidade que essa e outras instituições do SUS encontram para absorver e tratar os milhares de pacientes portadores de câncer, que morrem antes mesmo de terem uma única consulta com um oncologista. Se o serviço de assistência é excelente ou não, pouco importa para o doente que não consegue sequer ter acesso a esse serviço.
Xingamentos, boas e más intenções e suas consequências à parte, quero focar aqui no que entendo como o que há de mais válido nos posts do Facebook: trazer o assunto do problema da saúde pública à tona, para protestar. Afinal, não é também para isso que servem as redes sociais? É em momentos como esse que a denúncia se faz ouvida. Ou será que alguém aí pararia para reclamar se tirássemos a figura do Lula e colocássemos a do Seu Zé? Pois saibam que morrem Zés aos montes, todos os dias, e é contra isso que as pessoas deveriam se indignar. Experimentem passar um dia na porta de um hospital público e aí sim vão ter motivos reais pra encherem seus perfis virtuais de mensagens de repúdio.
Por que só agora, com Lula, e não antes com José Alencar, Roseana Sarney, Ana Maria Braga, o Hebe, é questionamento secundário. Talvez por ter sido ele a representação máxima do poder público e do descaso com a saúde nos últimos anos, sei lá. Obviamente, isso não justifica as mensagens rancorosas, de mau agouro, preconceituosas e discriminatórias que pululam na internet.
Obviamente também, não desejo a Lula ou a qualquer pessoa que veja sua vida dependente do SUS. Não pelo potencial do sistema, que é enorme, principalmente quando pegamos como exemplo instituições sérias, bem geridas e com profissionais comprometidos; mas pela incapacidade do SUS de, como está, garantir uma assistência no mínimo suficiente. Condeno e me envergonho com o rumo das discussões. Pois, enquanto nossos argumentos forem passionais, continuaremos sujeitos a propostas passionais eleitoreiras que, como vemos, desaguarão em desapontamento e raiva. Mas apoio o protesto e acho que a iniciativa foi válida em sua origem, ainda que tenha servido apenas para criar polêmica. Mas o SUS vai continuar deficitário e o Seu Zé vai continuar sem acesso ao Sírio Libanês.
Maria Falcão é médica e mestre em jornalismo científico pela universidade de Londres.

No Terra

1 comentários:

Anônimo disse...

Boa noite Rosangela, parabens p/blog!como faco p/compartir links de teu blog p/facebook?? e' possivel?
um abraco,Alda Cotta.