Srs. Diretores da Rede Globo
Causa profunda surpresa, indignação e perplexidade assistir a um programa de vossa emissora em que jornalistas, comentaristas e palpiteiros assumam a defesa explícita da prática de assassinatos como meio válido de fazer política. Isso foi feito abertamente, no dia 15.01.2012, por Diogo Mainardi e Caio Blinder, ambos empregados da Rede Globo (o trecho em questão pode ser acessado pelo link: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=kH3oThn1l7g
Depois de fazer brincadeiras de gosto duvidoso sobre sua suposta condição de agente do Mossad (serviço secreto israelense), Caio Blinder alegou que os cientistas que trabalham no programa nuclear iraniano são empregados de um "estado terrorista", que "viola as resoluções da ONU" e que por isso o seu assassinato não constituiria um ato terrorista, mas sim um ato legítimo de defesa contra o terrorismo.
Trata-se, óbvio, de uma lógica primária erudimentar, com a qual Mainardi concordou integralmente. Parece não ocorrer a ambos o fato de que o Estado de Israel é liderança mundial quando se trata em violar as resoluções da ONU, e que é acusado de prática de terrorismo pela imensa maioria dos países-membros da entidade. Será que Caio Blinder defende, então, o assassinato seletivo de cientistas que trabalham no programa nuclear israelense (jamais oficializado, jamais reconhecido mas amplamente conhecido e documentado)?Ambos - o "agente do Mossad" Caio Blinder e Diogo Mainardi – se associam ao evangelista fundamentalista estadunidense Pat Robertson, que, em abril de 2005, defendeu em rede nacional de televisão, com "argumentos" semelhantes, o assassinato do presidente venezuelano Hugo Chávez, provocando comentários constrangidos da Casa Branca.
Ao divulgar a defesa da prática do assassinato como meio de fazer política, a Rede Globo dá as mãos ao fundamentalismo - não importa se de natureza religiosa ou ideológica - e abre um precedente muito perigoso no Brasil. Isso é inaceitável. Atenção: não defendemos, aqui, qualquer tipo de censura, nem queremos restringir a liberdade de expressão. Não se trata de desqualificar ideias ou conceitos explicitados por vossos funcionários.O que está em discussão não são apenas ideias.
Não são as opiniões de quem quer que seja sobre o programa nuclear iraniano (ou israelense, ou estadunidense...), mas sim o direi to que tem uma emissora de levar ao ar a defesa da prática do assassinato, ainda mais feita por articulistas marcadamente preconceituosos e racistas. Em abril de 2011, o mesmo "agente do Mossad" Caio Blinder qualificou como "piranha" a rainha Rainha da Jordânia, estendendo por meio dela o insulto às mulheres islâmicas.
Mainardi é pródigo em insultos, não apenas contra o Islã mas também contra o povobrasileiro.Se uma emissora do porte da Globo dá abrigo a tais absurdos, mais tarde não poderá se lamentar quando outros começarem a defender, entre outras coisas, a legitimidade de se plantar bombas contra instalações de vossa emissora por quaisquer motivos, reais ou imaginários - por exemplo, como forma de represália pelas íntimas relações mantidas com a ditadura militar no passado recente, pela prática de ataques racistas contra o Islã e o mundo árabe, ou ainda pelos ataques contumazes aos movimentos sociais brasileiros e latino-americanos.
Manifestações como essas do "agente do Mossad" Caio Blinder e Diogo Mainardi ferem as normas mais elementares da convivência civilizada. Esperamos que a Rede Globo se retrate publicamente, para dizer o mínimo, tomando distância de mais essa demonstração racista de barbárie. Agradecemos a atenção.
Assinam os representantes e instituições:
- Hamilton Otavio de Souza - Editor Chefe da Revista Caros Amigos
- José Arbex Jr. - Chefe do Departamento de Jornalismo da PUC-SP
- Fabio Bosco - Central Sindical e Popular
- Francisco Miraglia Neto - Vice-Presidente Regional do ANDES-SN
- Reginaldo M. Nasser - Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da PUC-SP
- Marco Weisheimer - Editor da Carta Maior
- Socorro Gomes - Presidente do Centro Brasileiro para a Paz
- Soraya Misleh - Diretora de Imprensa do Instituto da Cultura Árabe
- Soraya Smaili - Vice-Presidente da Associação dos Docentes da UNIFESP
- Boris Vargaftig - Professor Titular da USP, membro da Academia Brasileira de Ciências
- Isabelle Somma - jornalista e doutoranda de Historia Social da USP.
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