Preconceito se combate com ações e não com demagogia para se manter do poder. Dá para entender ou vou ter que desenhar?
A necessidade de adotar uma postura anti-racista em sala de aula é um debate que se coloca em questão de tal forma que em 2003 foi aprovada a Lei 10.639 que altera a Lei de Diretrizes e Bases para que se dê ênfase para o papel do negro na sociedade brasileira não apenas como vencido. Assim,
“O desafio posto pela conjuntura, passa, portanto, pela conjunção de esforços da União, dos Estados e dos Municípios no sentido de assegurar a definição dos parâmetros curriculares, a sistematização e a disponibilização das fontes bibliográficas, o desenvolvimento de uma metodologia para a capacitação dos professores e a edição de materiais educativas destinados a professores, alunos e pais” (BENTO; SILVEIRA; CHINALLI, 2005:13).
Nesse sentido, a modificação na LDB visa implementar a obrigatoriedade da história e cultura afro-brasileira e africana nas redes de ensino brasileiras, o que não se restringe apenas à disciplina de história. Além disso, destaca que o Estado deve investir nos recursos efetivos e na valorização dos docentes. Segundo o texto da LDB/LEI 10.639/2003, destacaria os seguintes incisos:
Artigo 3º, § 4º – O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia.
Art. 26-A – Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1º – O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2º – Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileiras serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
A implementação da Lei 10.639 insere-se em um processo que visa à inserção igualitária dos negros no ensino por meio de ações afirmativas, já que entendesse que, mesmo com a melhoria da educação por meio de políticas para toda a população, os afro-descendentes continuam em desigualdade social em relação aos brancos. Desse modo, políticas afirmativas ajudariam a interferir na reversão das desigualdades e instaura processos de construção da igualdade social. Nesse sentido,
“[...] o Movimento Negro apontou há décadas: as políticas universais não alteraram as desigualdades raciais. A evolução da escolarização entre os grupos assume trajetória semelhante, mantendo a diferença entre brancos e negros. Todos se beneficiam com mais escolarização, mas a desigualdade entre negros e brancos permanece inalterada” (BENTO; SILVEIRA; CHINALLI, 2005: 26).
Por conseguinte, o mesmo estudo define política afirmativa como:
“A expressão ação afirmativa indica a necessidade de compensar os negros e outras minorias pela discriminação sofrida no passado. Devem ser distribuídos recursos sociais como empregos, educação, moradia, etc., de forma a promover a igualdade social. Trata-se, portanto, de construir uma ampla rede de programas destinados a superar os efeitos da discriminação histórica, de promover oportunidades iguais para grupos discriminados de forma negativa” (BENTO; SILVEIRA; CHINALLI, 2005: 27).
Tendo em vista o que foi elucidado até então, a mudança na LDB, possibilitaria aos alunos, principalmente negros, superar a visão eurocêntrica de mundo, estimulando um ambiente efetivo de diversidade e igualdade cultural no interior do espaço escolar. Especificamente para os alunos negros, a implementação efetiva da Lei daria suportes para fortalecer a sua auto-estima. Essas idéias estimulariam o exercício do pensamento crítico e ajudariam a formar uma mentalidade não racista que estimulasse as lutas pela promoção da igualdade social.
A Lei não surge “do nada”, mas sim de uma demanda social, principalmente do movimento negro, que resultou de anos de luta em prol do combate ao racismo. Entretanto, só a lei não mudará uma situação desigual existente entre negros e brancos no país e uma história educacional que não privilegiava outro lugar aos negros a não ser o “tronco”, ou seja, o negro como escravo, deixando de lado todo o legado africano que constituiu a formação da nacionalidade e da sociedade brasileira. Portanto, se estabelece a relação que há entre a Lei e a pressão do movimento negro e de setores da sociedade conscientes da importância de sua implementação. É nessa relação que está a importância da Lei, já que ao mesmo tempo em que ela é resultado de luta também chama atenção e levanta questionamentos para um problema que deve ser levado a sério, mesmo que ela não esteja sendo implementada plenamente. Assim, conforme Santos,
“Os movimentos sociais negros, bem como muitos intelectuais negros engajados na luta do anti-racismo, levaram mais de meio século para conseguir a obrigatoriedade do estudo da história do continente africano e dos africanos, da luta dos negros no Brasil, da cultura negra brasileira e do negro na formação da sociedade nacional brasileira. Contudo, torná-los obrigatórios, embora seja condição necessária, não é condição suficiente para a sua implementação de fato. Segundo o nosso entendimento, a Lei número 10.639, de 09 de janeiro de 2003, apresenta falhas que podem inviabilizar o seu real objetivo, qual seja a valorização dos negros e o fim do embranquecimento cultural do sistema de ensino brasileiro. A Lei federal, simultaneamente, indica uma certa sensibilidade às reivindicações e pressões históricas dos movimentos negros e anti-racistas brasileiros, como também indica uma certa falta de compromisso vigoroso com a sua execução e, principalmente, com a sua a eficácia, de vez que não entendeu aquela obrigatoriedade aos programas de ensino e/ou cursos de graduação, especialmente os de licenciatura, das universidades públicas e privadas, conforme uma das reivindicações da Convenção Nacional do Negro pela Constituinte, realizada em Brasília-DF, em agosto de 1986″ (2005: 34).
Cabe salientar, por último, que essa lei foi retificada pela de 2008 que mantem os mesmo dispositivos, mas apenas acrescenta o ensino de história indígena como obrigatório. Esse fato é igualmente importante, pois é um passo a mais na aplicação de um ensino que comtemple a diversidade do nosso país.
Portanto, chamou-se atenção para a instituição da Lei 10.639 e a sua importância para implementar práticas anti-racistas no ambiente escolar, embora ainda haja um “bom caminho” a percorrer para que ela seja implementada de maneira eficaz, visando combater o ensino eurocêntrico. A lei surgiu através de lutas, de resultado de ações que visassem posturas anti-racistas. Então, fica claro que para sua orientação ser efetiva ainda há demanda de muito esforço.
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