domingo, 3 de março de 2013

É religioso, é negro, é gay, é ativista e vive em uma união estável: Uma pessoa abençoada que não tem prá onde correr!

É religioso, é negro, é gay, é ativista e vive em uma união estável: Uma pessoa abençoada que não tem prá onde correr!


por marcos romão - mampress
Meu amigo P.* ligou-me abismado nesta madrugada:
“Romão, você que é um cara que viveu tanto anos lá fora, me diga se entende o que está acontecendo?  Não posso acreditar que vá presidir a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, uma pessoa fundamentalista, que acha que os negros são amaldiçoados,que pessoas do mesmo sexo não possam se unir, e que além de disso afirma que relações homossexuais levam ao ódio, ao crime e a rejeição. Me diga, Romão, o que que este cara quer fazer lá. Será que ele quer destruir todos os direitos humanos que conquistamos com tanta luta, tantas perdas por assassinatos e tantas perdas de empregos e rejeições?”
direitos-humanos-forbiddenSem resposta pronta, respirei fundo e comecei a lembra-lo dos tempos em que nos conhecemos na década de setenta,  tempos em que ser homossexual era doença, ser negro era ter marca de criminoso e ser religioso era cheirar ópio do povo nas rodas contra a ditadura  em que conviviamos.
As barreiras foram quebradas pouco a pouco, no movimento negro, já não nos viam como “caso”, mas sim como companheiros que lutavam pelos direitos humanos. Na esquerda, ganhamos respeito, quando abrigávamos e protegíamos pessoas  das garras do obscurantismo contra todos os que pensassem diferente. Um negro que ao tempo era “neguinho”, um gay, que na época era veado, e um religioso que na época era perseguido como bruxo do mal, tudo nas mesmas pessoas foram conseguindo respeito nos meios oprimidos.
Lembrei a P. de nossas idas às Baixadas do País, bater boca com polícia e escutar deles, “mas o cara é bandido, só estamos querendo proteger a sociedade”, enquanto rangiam os dentes chateados por terem de parar de dar porrada, já eram os anos 80. sempre que eu chamava P.. ele vinha comigo naquelas missões impossíveis e anônimas para defender os direitos humanos de muita gente, que às vezes, sentiamos nem gostavam de “veado” nem “preto” e terminavam por terem outra visão no calor do convívio na hora do sufoco.
P. e eu sempre tivemos o princípio de gritarmos quando vemos alguém apanhar, de gritarmos sempre que alguém esta sendo violado. Primeiro esta pessoa tem que parar de ser surrada e violada, depois vamos vamos bater papos sobre idéias. Sabemos que não se conversa com pessoas mortas. Lamentavelmente muita gente é morta pelas idéias que as pessoas teem dela.
É o caso deste pastor que defende suas idéias em seu púlpito e que quer agora defender estas idéias fundamentalistas e genocidas na Comissão Oficial de Defesa dos Direitos Humano da Câmara de Deputados.
Lembramos de nossas conversas em 70 e 80 com todos os movimentos sociais e a sociedade, e de como todos nós fomos quebrando preconceitos que tínhamos entre nós (ainda temos muitos mas a conversa e o entendimento progridem). Em especial, nos recordamos de conversas com religiosos, sobre ser humano e religião, esse tema que como futebol provoca tantas paixões e incompreensões.
Confiavam em nós e nos falavam de seus conflitos intimos e de fé.  Sexualidade e raça e gênero era onde mais doía para eles, religiosos que aprendiam a compaixão como princípio, compaixão como significado de apaixonar-se junto pelo ser humano, seu ser, e que  conflitava-se com suas doutrinas, e por isto sofriam discriminaçõess em seus espaços de vivências religiosas. Nós os ajudamos também.
Terminamos sem resposta sobre como isto pode acontecer, um fundamentalista intolerante ocupar uma cadeira discreta de defensor dos direitos humanos, para trasformá-la em púlpito para atacar os mesmos direitos humanos tão duramente conquistados pela sociedade brasileira, direitos mesmo que incipientes e longe da plena cidadania.
Opinei que se o pastor Marcos Feliciano é um cara sincero, e que acredita no que falou em público, por conta desta sinceridade ele mesmo desistirá de ocupar este cargo, por uma questão de fôro íntimo e ninguém o condenará.
Caso não o faça nos dará uma demonstração de que é uma pessoa despreparada e mal intencionada na ocupação deste posto, que exige isenção, compaixão e estar despido dos próprios preconceitos para exercê-lo. Caberá então à sociedade civil fazer todo o póssível para impedir que ele assuma, e defender os direitos humanos de todos que terão seus direitos violados pela presença de uma pessoa inadequada para a posição.
Quanto a mim e meu amigo P. já decidimos o que fazer, caso um de nós dois tenha seus direitos humanos violados no Brasil, encaminharemos o caso diretamente à Comissão de Direitos Humanos da OEA, pois sabemos profissionalmente que não se entrega a ficha de vítimas à pessoas ou estados que não as reconhecam como pessoas humanas com direitos iguais.
*P é uma pessoa que existe e vive em um estado do Brasil em que homossexuais e negros são perseguidos, quando não mortos.( como o espectro dos estados brasileiros onde isto acontece é enorme, ele pode estar em qualquer lugar e realmente não vai ter mais para onde correr).

0 comentários: