segunda-feira, 29 de julho de 2013

Machismo não é arte, machismo não é punk, machismo é violência

Machismo não é arte, machismo não é punk, machismo é violência

Marcha das Vadias - Recife

NOTA DE REPÚDIO ÀS DECLARAÇÕES MACHISTAS DE ORTINHO
MACHISMO NÃO É ARTE; MACHISMO NÃO É PUNK
MACHISMO É O SISTEMA OPRESSOR EM SUA FACE MAIS CRUEL
No dia 20 de julho, o cantor Ortinho, durante um show no Festival de Inverno de Garanhuns 2013, incitou seu público a só respeitarem as mulheres grávidas e a “meter o dedo no parreco” das outras, que segundo ele, queriam mesmo é “dar” e “foder”.
O fato repercutiu nas redes sociais e a sociedade civil pediu uma resposta tanto do cantor quanto da Secretaria da Cultura, que financiou o show.
A resposta veio, para maior decepção.
Em sua nota de desculpas, o cantor afirma que “o show foi bastante aplaudido” e que “houve uma supervalorização do fato por eu ser uma figura pública”.
Mais grave do que isso foi a nota da Secretaria de Cultura de Pernambuco e Fundarpe, pela qual o Governo de Estado lamenta a frase dita pelo músico e finda enaltecendo a importância da banda para a cena de rock dos anos 90 e afirmando que a cena em que os fãs saudosos dançavam numa “roda de pogo” [dança punk] era “muito mais importante do que qualquer frase pronunciada por Ortinho na mesma apresentação”.
Ao cantor, ao Governo do Estado e a todos que trataram a situação como uma “frase infeliz” que não tirou o brilho do show tão aplaudido é necessário dizer que o cantor incidiu no delito de incitação pública à prática de crime, previsto no art. 286 do Código Penal.
Mais grave: incidiu na incitação pública à prática de crime de ódio, que é aquele motivado pelo preconceito e que seleciona intencionalmente a sua vítima em razão do grupo social ao qual pertence.
Ora, Pernambuco é um dos estados da federação que bate recordes de violência contra a mulher que não podem orgulhar a ninguém: O Brasil ocupa o 7º lugar entre os países com de elevados níveis de feminicídio. Pernambuco está entre os 5 estados com maior taxa de morte por agressão a mulheres. E em Pernambuco tivemos 273 mortes de mulheres em 2011 e 207 em 2012. Dessas mortes, cerca de metade praticada por parceiro íntimo. Como é possível, nesse contexto, aceitar a incitação à violência contra a mulher como uma frase menos importante do que os aplausos que o cantor recebeu?
Alegar uma roda de pogo como desculpa para diminuir o impacto da incitação à violência contra a mulher é também uma ofensa ao movimento punk, contra-cultural e subversivo por essência. Tampouco alegar liberdade de expressão para erradicar a liberdade alheia pode ser chamado de arte.
O machismo é uma das formas de opressão do ser humano mais tradicionais e enraizadas na cultura do establishment, é uma das mais crueis formas de imposição de força arbitrária e injusta.
E o machismo só existe porque é culturalmente aceito. Porque ele é repetido à exaustão como algo inofensivo. Tão inofensivo a ponto de ser menos importante do que uma roda de pogo.
Nós, mulheres, somos agredidas todos os dias pelo simples fato de termos nascido mulheres. E enquanto houver uma cultura de tolerância e de aceitação dessa violência, nós vamos continuar morrendo e sendo silenciadas.
Por isso, nós é que estamos “pogando” no sistema opressor, patriarcal, machista, excludente, desumano, ao denunciarmos a brutalidade da violência contra a mulher e ao propormos um discurso de fato contra-cultural.
E convidamos o cantor e a Secretaria de Cultura de Pernambuco a, junto conosco, “pogar” de verdade, porque fazer pose de punk é tão falso quanto inútil.
Diante disso, pedimos:
1) A retratação do Governo do Estado sobre a nota emitida acerca do episódio, através da sua Secretaria de Cultura e Fundarpe, reconhecendo que a incitação à violência contra a mulher é fato gravíssimo que deve ser repudiado por toda a sociedade e pelo próprio Governo e que tem importância autônoma em relação ao pretenso valor artístico do evento.

2) Que haja articulação entre a Secretaria da Mulher e a Secretaria de Cultura, assegurado o diálogo com a sociedade civil e os movimentos e articulações de defesa dos direitos das mulheres, para fortalecimento das políticas públicas culturais feitas por e voltadas para a mulher.

3) Que seja criada uma comissão especial com participação dos diversos segmentos da sociedade civil para elaborar projeto de lei que vede o financiamento público de produtos culturais que promovam discurso de ódio e que promova a relação entre os direitos das mulheres e as expressões culturais.

4) Que seja firmado Termo de Ajustamento de Conduta entre a Secretaria de Cultura e o cantor, no qual o mesmo se compromete a jamais promover qualquer discurso de ódio contra qualquer grupo social oprimido, como condição para que possa participar de eventos promovidos pelo poder público estadual.
Recife e Garanhuns, 27 de julho de 2013.
Marcha das Vadias dos Recife
DCE UNICAP
Coletivo Rompendo Amarras
Movimento Zoada
Grupo Curumim
Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás
Grupo Diversidade – UNICAP
Coletivo Flores Crew
Coletivo Ou Vai ou Racha
Najup – Núcleo de Assessoria Jurídica Popular/UFPE
Partido Pirata do Brasil
PSol
Muda – Direito UNICAP

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