domingo, 12 de outubro de 2014

"não reconheço a ninguém autoridade moral, intelectual ou política para julgar o meu modo de

"não reconheço a ninguém autoridade moral, intelectual ou política para julgar o meu modo de exercer esta liberdade"

É isso que penso e assino sem nenhuma dúvida.



por Adriano Pilatti
É engraçado ver moralistas vociferarem contra o chamado “voto útil” – em “ciência política”, se diz voto “estratégico” ou “sofisticado”, em contraposição ao voto “sincero” ou “ingênuo”. De moralistas tudo se espera, menos ideias adequadas, mas nesse caso sua “indignação” se volta contra a própria lógica dos sistemas deliberativos.
Voto sincero e voto estratégico são opções igualmente legítimas simplesmente porque integram o já estreito repertório de direitos inerentes à relativa liberdade de votar. Liberdade relativa porque sempre escolhemos entre opções que não definimos: o quadro de candidatos, partidos ou propostas existentes numa determinada disputa. Nesse sentido, todo voto é sempre, em maior ou menor medida, estratégico: escolhemos entre opções pré-definidas por outros, outra coisa que o moralismo finge ignorar.
Nas eleições em dois turnos, o voto estratégico é parte inerente do “jogo” representativo. “Au premier tour, on choisit; au second, on élimine” (no primeiro turno se escolhe; no segundo, se elimina) dizem os franceses sobre o “ballotage”, sistema em dois turnos que adotam inclusive nas eleições “distritais” parlamentares.
Em sistemas como o francês e o brasileiro, o primeiro turno é em geral o momento do voto sincero em favor da opção preferida. E, se a opção preferida não chegou ao segundo turno, este se torna o momento do voto estratégico, para impedir a vitória da opção que mais se rejeita. Para todos cujos candidatos não chegam ao segundo turno, o voto é muito mais veto a um candidato do que confiança em outro. Moralistas vivem brigando com a realidade, mas é assim que ela é.
Claro, o voto estratégico só faz sentido quando uma das alternativas à disposição é minimamente aceitável para quem o exercita, quando há diferença relevante entre uma e outra para quem vota. E quem vota é o único juiz legítimo dessa escolha. Caso quem escolhe não vislumbre diferença que lhe pareça relevante entre uma e outra alternativa, então o voto nulo se torna uma opção igualmente legítima.
Pessoalmente, não vejo razão para escolher entre um e outro no segundo turno para o governo do Rio. Recuso-me a escolher entre duas gangues. Recuso-me a escolher entre quem nos massacrou nas ruas e saqueia o Rio, de um lado, e quem tenta destruir a religiosidade afro-brasileira, que tanto admiro, e integra uma máquina lucrativa e inescrupulosa de extorsão espiritual, de outro. Voto nulo com muito orgulho, porque rejeito ambas as nulidades à disposição.
Já para a Presidência, reitero que, apesar de todos os pesares e das constrangedoras semelhanças, para mim há diferenças mais do que relevantes entre uma e outra opção. Por isso vou votar em Dilma, que respeito mas não admiro, para vetar Aécio, que simplesmente abomino.
Não haverá no meu voto nenhuma renovação de confiança em uma, mas puramente uma rejeição absoluta a outro. Votarei para eliminar o adversário que considero mais letal para os movimentos e as lutas por direitos. Votarei para tentar influir na definição das condições sob as quais lutaremos, e na escolha de contra quem o faremos. Porque é da lógica do sistema, porque é um direito que conquistei – e não reconheço a ninguém autoridade moral, intelectual ou política para julgar o meu modo de exercer esta liberdade.

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