sábado, 15 de novembro de 2014

À sombra dos homens

À sombra dos homens



Ilustração: Lumi Mae
Ilustração: Lumi Mae

Comentando a Pergunta da Semana

A grande maioria das pessoas que responderam à enquete da semana acredita que mulher se esforça para ajustar sua imagem às exigências dos homens, o que não é nenhuma novidade.
As mulheres do século 19 deviam ser castas e submissas ao homem, ansiosas por serem protegidas por ele. A partir daí podemos entender melhor como as heroínas dos contos de fadas, no registro dos irmãos Grimm, desse período, fizeram tanto sucesso.
Elas foram se tornando passivas e assexuadas. Cinderela, Branca de Neve, A Bela Adormecida, modelos de heroínas românticas, que, ao contrário do que se poderia imaginar, no que diz respeito ao amor, ainda são muito parecidas com muitas mulheres de hoje.
Um bom exemplo é Lu, professora de inglês, 34 anos. Ela chegou ao meu consultório e foi logo dizendo: “Não tenho nada a ver com essas mulheres modernas, que têm que lutar pela sobrevivência e vivem sozinhas. Não aguento mais ter que arranjar dinheiro para pagar as contas. Estou buscando um homem que me proteja, cuide de mim e me sustente.”
Nesses contos de fadas, existem algumas mulheres que até fazem mágicas, mas a mensagem central não é a do poder feminino, e sim a da impotência da mulher. O homem, ao contrário, é poderoso. Não só dirige todo o reino, como também tem o poder mágico de despertar a heroína do sono profundo com um simples beijo.
Além da incompetência de lutar por si própria, comum às principais heroínas, Cinderela é enaltecida por ser explorada dia e noite, trabalhando sem reclamar e sem se rebelar contra as injustiças. Padece e chora em silêncio. Seu comportamento sofrido, parte do treinamento para se tornar a esposa submissa ideal, é recompensado. Seu pé cabe direitinho no sapato e ela se casa com o príncipe.
No entanto, o mais grave nos contos de fadas é a ideia de que as mulheres só podem ser salvas da miséria ou melhorar de vida por meio da relação com um homem. As meninas vão aprendendo, então, a ter fantasias de salvamento, em vez de desenvolver suas próprias capacidades e talentos.
Para a historiadora americana Riane Eisler essas histórias incutem nas mentes das meninas um roteiro feminino no qual lhes ensinam a ver seus corpos como bens de comércio para segurança, felicidade — e, se conseguirem pegar não um sujeito comum, mas um príncipe —, status e riqueza.
Ela acredita que a mensagem dos “inocentes” contos de fadas, como Cinderela, é que não somente as prostitutas, mas todas as mulheres devem negociar seu corpo com homens de muitos recursos. Em vez de desenvolver suas próprias potencialidades e buscar relações onde haja uma troca afetivo-sexual, em nível de igualdade com o parceiro, muitas mulheres se limitam a continuar fazendo tudo para encontrar o príncipe encantado.
A menina na nossa cultura aprende desde cedo a ser romântica e submissa. Além dos contos de fadas, todos os meios de comunicação, família e escola, colaboram para isso. Um estudo feito nos Estados Unidos concluiu que as escolas americanas ludibriam as meninas. Além de receberem mais atenção dos professores, os meninos são recompensados por se valorizarem e as meninas por serem dóceis e quietas.
Assim, quando se tornam adultas, já estão bem treinadas para tentar corresponder ao que os homens delas esperam. Contudo, as mentalidades estão mudando e um grande número de mulheres não se dispõe mais a ajustar sua imagem às exigências e necessidades masculinas.
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