sábado, 8 de dezembro de 2012

Decididamente, o machismo não tem limite: Alegação de estupro em estado de necessidade

Decididamente, o machismo não tem limite:  Alegação de estupro em estado de necessidade

Vi o assunto ser debatido, ontem, na página do Facebook do Thiago Viana Guarani-Kaiowá. Não resisti e fui pesquisar no Google, vomitei quando encontrei.

Jamais imaginei ler uma alegação tão, mas tão nojenta e revoltante.

A alegação aconteceu em 1999 e é para mim um alerta, nada é impossível para o machismo.





Sessão Extraordinária do dia 08 de julho de 2003
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 006730/2003 – ALCÂNTARA (MA)
Apelante : Raimundo Benedito Alves Filho
Advogado : Dr. Catarino Ribeiro
Apelado : Ministério Público Estadual
Promotor de Justiça : Dr. José Alexandre Rocha
Juíza Prolatora : Dr.ª Cristiana de Sousa Ferraz Mattos
Relator : Des. Benedito de Jesus Guimarães Belo
Revisor : Des. Antonio Fernando Bayma Araujo

ACÓRDÃO N.º 45.395/2003.

E M E N T A

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO. ESTADO DE NECESSIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PERIGO REAL E INEVITÁVEL. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.

I – Não se configura o estado de necessidade, causa exculpante de criminalidade, quando ausente qualquer situação conflitual que pudesse ser resolvida com a permissão outorgada pelo ordenamento jurídico pátrio a justificar o sacrifício do interesse ou do outro bem jurídico.

II – Recurso de Apelação conhecido e improvido. Unanimidade.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade de votos, nos termos do voto do Desembargador Relator e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em negar provimento ao Recurso, mantendo incólume a decisão vergastada.

R E L A T Ó R I O

Como relatório, passando a integrar o presente Acórdão, o constante das f. 105/107, que passo a transcrever ipsis litteris: 

Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo acusado Raimundo Benedito Alves Filho, por via de seu advogado, inconformado com a sentença monocrática que o condenou como incurso nas penas do artigo 213, do Código Penal Brasileiro, a uma pena definitiva de 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime integralmente fechado, na Penitenciária Agrícola de Pedrinhas.

Narram os autos que o acusado Raimundo Benedito Alves Filho, por volta das 20:30 horas do dia 31 de julho de 1998, aproximou-se da vítima Antonina Araújo Costa, sua ex-companheira, manifestando interesse em conversar, mantendo-a, entretanto, mediante intensa violência, sob a sua companhia, até às 02:30 horas do dia seguinte.

Nesse ínterim, mediante violência real e intimidação exercida com emprego de uma faca, a vítima foi arrastada para o mato e obrigada pelo acusado a com ele praticar conjunção carnal, além de atos libidinosos.

Denúncia recebida em data de 23 de março de 1999 e, designada audiência para interrogatório do acusado (f. 21).

Interrogado (f. 28/29), o acusado admitiu ser verdadeira a imputação que lhe é atribuída na denúncia.

Veio aos autos defesa prévia do acusado (f. 35), sustentando ser inocente. Arrolou testemunhas.

A instrução criminal transcorreu com a oitiva da vítima (f. 37/39), além de 02 (duas) testemunhas de acusação (f. 40/43) e 02 (duas) testemunhas de defesa (f.48/50).

Nenhuma diligência foi requerida pelas partes.

Alegações finais do Ministério Público (f. 55/57), pugnando pela condenação do acusado nas penas do crime previsto no artigo 213, do Código Penal.

A defesa do acusado Raimundo Benedito Alves Filho, em alegações finais (f. 62), requereu a redução de pena, por ser o acusado primário, de bons antecedentes e possuir residência fixa.

Sentença Condenatória (f. 64/74), prolatada em 27 de junho de 2001, condenando o acusado, nas penas do artigo 213, do Código Penal.

Intimação do acusado em 22 de agosto de 2001 (f. 75v).

Em data de 24 de agosto de 2001, o acusado, por via de seu advogado, devidamente constituído, interpôs Recurso de Apelação contra a Sentença Monocrática (f. 76/77), cujas razões foram apresentadas em 16 de novembro de 2001 (f. 79/83), alegando ter cometido o fato sob a proteção de causa excludente de ilicitude, ou seja, em estado de necessidade, pugnando assim, pela reforma da decisão condenatória, para que seja absolvido da imputação que lhe é atribuída na denúncia.

Contra razões do Ministério Público (f. 87/92), pugnando pelo improvimento do recurso, mantendo-se a sentença condenatória.

Encaminhados os autos à Procuradoria-Geral de Justiça, esta opina, através do judicioso parecer da lavra do eminente procurador de justiça, o Doutor Eduardo Jorge Hiluy Nicolau, constante das f. 100/104, pelo improvimento do apelo. 

V O T O

Ab initio, no exercício do juízo de prelibação, verifico pois, a presença dos requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual, hei por bem conhecer do Apelo.

Por outro lado, após compulsar os autos, não estou a verificar razão plausível para desconstituir a sentença combatida.

Como visto, a matéria revelada na presente peça recursiva, se consubstancia na alegação de que o apelante praticou o fato descrito na denúncia, sob o manto do estado de necessidade.

Inserido na Legislação Substantiva Penal como uma das causas de exclusão de ilicitude, o estado de necessidade, que tem o condão de licitar conduta humana que se ajusta, prima facie, a uma figura típica, se revela quando o agente, para salvar de perigo atual e inevitável, um bem jurídico próprio ou de terceiro, vê-se na contingência de lesionar bem jurídico alheio.

Em outras palavras, para que se verifique a presença dessa causa excludente de criminalidade, faz-se imperativo, antes de tudo, que o agente esteja diante de situação de perigo real, efetivo e, que seja este inevitável, senão pela violação do bem de terceiro inocente.

Todavia, na espécie, não se faz por elevar dos autos, qualquer situação conflitual de interesses, isto é, qualquer colisão entre bem jurídicos, que pudesse ser resolvida com a permissão outorgada pelo ordenamento jurídico pátrio a justificar o sacrifício do interesse ou do outro bem jurídico.

Aliás, deflagrou-se a presente ação penal, em verdade, para apuração da culpabilidade do apelante da imputação de conduta tipificada no artigo 213 , do Código Penal, ou seja, crime de estupro, daqueles elevados à condição de hediondo, que tutela a liberdade sexual da mulher.
Nesse diapasão, a prática da sobredita conduta típica pelo apelante, não aponta para a concretização dos requisitos ensejadores da causa exculpante de criminalidade invocada, ao revés, demonstra a sua insensibilidade e torpeza, ao constranger a vítima, mediante violência real, para a prática da conjunção carnal.

Portanto, à evidência da prática pelo apelante de fato típico, antijurídico e culpável, quando lhe era exigida conduta diversa, não se faz por amoldar à espécie, a causa excludente de criminalidade invocada, qual seja, o estado de necessidade. 

Nesse sentido:

“O estado de necessidade – excludente objetiva de criminalidade – não se caracteriza quando ao agente era razoável exigir-se conduta diversa” (TJDF – AC – Rel. Luiz Vicente Cernicchiaro – DJU 16.05.1978, p. 3.368).

Posto isto, e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, conheço do Recurso para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo incólume a decisão vergastada.

É o voto.

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luis, 08 de julho de 2003.

Desembargador ANTONIO FERNANDO BAYMA ARAUJO
PRESIDENTE

Desembargador BENEDITO DE JESUS GUIMARÃES BELO
RELATOR

Tomou parte neste julgamento, além dos que assinam, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Júlio Araújo Aires.

Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Doutor Krishnamurti Lopes Mendes França
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