segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Sobre o suicídio de Viviane Alves Guimarães Wahbe

Sobre o suicídio de Viviane Alves Guimarães Wahbe

Blogueiras Feministas


Arquivo pessoal, foto de Ana Rusche.
Texto de Ana Rusche.
A respeito do caso que envolve o falecimento de Viviane Alves Guimarães Wahbe, circulam textos raivosos, transtornados de revolta, obnubilados. É revoltante sim.
É revoltante o silêncio oficial de Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados à imprensa – o escritório “lamenta profundamente o ocorrido”, diz que “já está contribuindo para o entendimento do caso” e em respeito à memória de Viviane, “não se manifestará sobre o fato”.
É revoltante o silêncio que ronda a notícia tão avassaladora. O falecimento ocorreu no dia 3 de dezembro e, só para exemplificar, tanto a Folha de S. Paulo, quanto o Estadão apenas noticiaram o fato mais de 25 dias depois (embora o zunzunzum no meio jurídico não seja tão moroso).
A estratégia da retórica do silêncio aqui pouco convence: a falta de manifestação clara e transparente em defesa da vítima e da apuração do ocorrido é exatamente o que macula sua memória. Faz com que não se reconheça suas horas trabalhadas. Faz com que tudo pareça um ato de loucura isolado. Quando se deveria ler desespero, excesso de pressão, desamparo.
Que pressão imensa é essa que faz uma jovem se desesperar a este ponto?
A ponto de ser insuportável sobreviver a isso?
Mesmo que a investigação caminhe para concluir que não houve penetração (ou que nem conclua nada por conta da demora na apuração), impossível não discutir a respeito da ideia de assédio, dado que vivemos em uma cultura na qual a estagiária está sempre disponível para ser assediada. É paradoxal que a “desonra perante os colegas” recaia na figura da estagiária, como se a assediada tivesse que aprender algo com isso. A desonra deve recair sobre quem covardemente assedia por aí.
A estagiária, em seu papel subalterno de aprendizado profissional, acaba por carregar o assédio naturalizado, o estigma que está disponível por sua fragilidade e pouca experiência. Presume-se que seja óbvia sua submissão sexual e até se insinue que seu aprendizado profissional passe por aí. Daí existe a simpática expressão “teste do sofá”.
E muitas estagiárias inclusive possuem orgulho desta incrível capacidade de causar desejo, em lugar de perceber que o ‘poder’ de sedução esconde a perigosa moeda da própria submissão de seu desejo.Mais bonito seria o poder de desejar quem ela bem entendesse e não a quem ensinaram a causar desejo. E que maravilhoso seria então a relação espontânea entre dois colegas de trabalho! – aí se trataria de amor, de paixão, mas infelizmente estas palavras brilhantes não se aplicam a este texto sem viço.
Muito do silêncio por aí nasce ainda de um embaraço cúmplice – a noção que a tragédia “poderia ter acontecido em qualquer festa da firma”. É óbvio que não se trata de uma violência isolada. Muito do silêncio nasce do medo, esse pacto tenebroso que une assediador e assediada. Muito do silêncio por aí nasce da hesitação, temor de quem pode perder o emprego se abrir o bico, de se expor ao ridículo, de defender e falar de assuntos que não são defensáveis.
A pergunta que li milhões de vezes nesses dias: a Índia é aqui? Minha resposta mais doída: não é. Pois 600 violonistas se reuniram em Darjeeling para tocar “Imagine” num canto de luto e luta em memória da estudante estuprada e morta.
Aqui o que ouço é somente o ruído surdo de São Paulo ao fundo. No máximo, um burburinho na recepção, uma fofoca no banheiro, um choro amargo e bem escondido no fundo da baia.

1 comentários:

Pitiko disse...

Não e tão simples assim. Ha muito a ser estudado.