sexta-feira, 25 de julho de 2014

Um juiz, duas atitudes, duas Justiças: Absolve o fazendeiro pedófilo e condena "as ladras de xampu e queijo"

Um juiz, duas atitudes, duas Justiças: Absolve o fazendeiro pedófilo e condena "as ladras de xampu e queijo"

Um juiz, duas atitudes, duas Justiças. Uma é tolerante e compreensiva com o fazendeiro, patriarca em Paraíso (cidade próxima a Catanduva), proprietário de canaviais no interior rico de São Paulo, que teria sido “enganado” pelas meninas, as quais lhe teriam asseverado serem maiores de 18 anos. A outra é indignada, raivosa, vingativa, exemplar. Esta é para as mulheres pobres que cometem os tais “crimes insignificantes”.
O que se verá nas linhas abaixo será o debate do desembargador Airton Vieira consigo mesmo. Em vermelho, trechos do acórdão por ele redigido, absolvendo o fazendeiro pedófilo ao mesmo tempo em que culpa as vítimas por seu modo de vida “devasso”. Em azul, trechos de sua fala contra as ladras de xampu e queijo.
Seria divertido, se não fosse trágico demais.
“É bem verdade que se trata de menor de 14 anos, mas entendo ser crível e verossímil, diante do que aconteceu, que o réu tenha se enganado quanto à idade real da vítima X, Afinal, partindo-se do pressuposto de que, no presente caso, a vítima X, à época dos fatos, contava com parcos 13 anos, 11 meses e 25 dias de idade, e, levando-se em consideração que era pessoa que se dedicava ao uso de drogas e ingestão excessiva de bebidas alcoólicas, [e que] já manteve relações sexuais com diversos homens, o que significa não ser ela nenhuma jejuna na prática sexual, é que não se pode presumir que o réu tinha conhecimento real da idade da vítima e que tinha o dolo de manter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos”.
“Hoje é uma gilete, amanhã é um quilo de carne… Você vai somando nos vários supermercados, nas várias lojas, isso ganha milhões. Por outro lado, se você não punir quem faz desse tipo de ação o seu dia a dia, ou ainda que seja uma vez isolada, você há de convir comigo o seguinte: todos nós estaremos legitimados a entrar em qualquer supermercado e subtrair algo na faixa de 5, 10, 20 reais. (…) Vejam o prejuízo que isso causa”.
Ponte também teve acesso ao excepcional documentário “Bagatela” (DocTV, direção Clara Ramos, 2009), que acompanhou as trajetórias de mulheres presas por cometer os chamados “crimes de bagatela”, aqueles pequenos furtos de produtos de valor irrisório (xampu, bolachas, leite em pó, queijo). No documentário, tem papel destacado o mesmo Airton Vieira, então juiz da 4º Vara Criminal Central de São Paulo, desta feita defendendo máximo rigor no julgamento desses crimes insignificantes.


Leia a íntegra na Ponte
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