Por Marcelo Vieira de Campos
Fruto de uma ação afirmativa do governo federal do Brasil em parceria com a sociedade civil atuante no tema, a Lei 11.340/06 nominada “Lei Maria da Penha”, que completa neste mês cinco anos de vigência, representa uma quebra de paradigma no enfrentamento à violência doméstica e familiar.
Desde sua entrada em vigor, a legislação tem avançado na proteção e garantias dos direitos das mulheres. Dados preliminares demonstram que desde a edição da Lei, em 2006, 70.574 mulheres conseguiram, na Justiça, medidas protetivas e houve ao menos 76 mil sentenças definitivas em processos por agressão a mulheres. Mencione-se, também, que foram decretadas aproximadamente duas mil prisões preventivas e cerca de oito mil prisões em flagrante em casos de violência doméstica e familiar contra mulheres.
Amparada sob o princípio da dignidade da pessoa humana e toda estrutura constitucional vigente no Brasil, a legislação atende aos diplomas internacionais na temática, como a Convenção Sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Cedaw) e a Convenção de Belém do Pará, ratificadas pelo Brasil, respectivamente em 1984 e em 1995, além de outros instrumentos de proteção Direitos Humanos.
Cabe ao Estado criar as condições para que as mulheres conheçam os seus direitos assegurados na Constituição Federal e na Lei Maria da Penha. Criar as condições para que as mulheres saibam reconhecer as situações em que esses direitos são violados e, especialmente, quais os mecanismos disponíveis e os equipamentos públicos que deve procurar é dever do Estado.
No âmbito do governo federal, por meio de um trabalho coordenado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República em conjunto com os ministérios foram criadas e aperfeiçoadas políticas públicas para promover e garantir os direitos à saúde, à assistência social, à educação, à segurança, à cultura e ao emprego das mulheres brasileiras.
Enquanto signatário do Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra a Mulher o Ministério da Justiça ao instituir o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que estabelece a integração de políticas sociais com políticas de segurança pública para a redução da violência e da criminalidade no país, inseriu no programa a ação de “Efetivação da Lei Maria da Penha” cuja implementação ficou sob a responsabilidade da Secretaria de Reforma do Judiciário. A SRJ exerce o papel de sensibilização e apoio aos órgãos que compõem o Sistema de Justiça Brasileiro para, efetivamente, tirar a Lei Maria da Penha do papel.
Numa política integrada com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foi possível um avanço significativo na implantação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. De 15 existentes em 2007, chegamos hoje ao número de 52 implantados em 24 estados brasileiros e no Distrito Federal. Dos 52 Juizados em funcionamento no país, 31 receberam o apoio financeiro e institucional do Ministério da Justiça por meio da Secretaria de Reforma do Judiciário. Últimos dados do CNJ apontam a distribuição de mais de 331 mil processos relacionados à violência doméstica e familiar contra a mulher. Dentro da política de democratização do acesso à Justiça foram apoiados, ainda, 22 Núcleos especializados de Atendimento à Mulher da Defensoria Pública e 34 Promotorias e Núcleos Especializados do Ministério Público.
Reconhecendo a necessidade de discussão do tema foi criado o Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid) para que juízes de todo o país, competentes para o julgamento dos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, possam trocar experiências e uniformizar procedimentos.
Para aprimorar a proteção das mulheres vítimas de violência familiar e doméstica, o Ministério da Justiça, a Secretaria de Política para Mulheres da Presidência da República, o Ministério Público Federal, o Conselho Nacional do Ministério Público e o Colégio dos Procuradores-Gerais de Justiça assinaram acordo de cooperação em março deste ano. O objetivo do acordo é intensificar a articulação entre os órgãos e zelar pela celeridade nos processos, de modo a evitar impunidade.
A despeito dos avanços verificados, é possível identificar dificuldades no caminho da consolidação da pauta em âmbito nacional. Impõem-se entre os principais obstáculos à implementação efetiva da lei, a discussão ainda em andamento sobre a constitucionalidade da Lei 11.340/2006 e sua interpretação e aplicação, por vezes, equivocadas. Destaca-se ainda a necessidade de interiorização da rede de acesso à Justiça Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a uniformidade na aplicação da lei nos órgãos jurisdicionais.
Vale mencionar que, em pesquisa realizada recentemente pelo Instituto Avon/Ipsos, em que são colhidas percepções sobre a violência doméstica contra a mulher no Brasil, constatou-se que 94% dos entrevistados conhecem a Lei Maria da Penha, mas apenas 13% a conhecem muito bem.
Com objetivo de dar continuidade à política pública de fortalecimento da democratização do acesso à Justiça, foi lançado em 12 de setembro Edital de Chamamento Público SRJ/MJ 1/2011 para apoiar unidades especializadas de violência doméstica e familiar contra a mulher no âmbito do Sistema de Justiça.
A implementação de uma política permanente de “Efetivação da Lei Maria da Penha” e a instituição de um novo ordenamento jurídico em que impera a prevalência dos direitos humanos das mulheres se mostra cada vez mais forte. Acreditamos que a estruturação de equipamentos públicos especializados, a mobilização da sociedade civil e o envolvimento do sistema de Justiça legitimam os 5 anos da Lei Maria da Penha e promove a mudança de cultura machista em nossa sociedade.
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