sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Juízes que autorizam trabalho infantil ignoram realidade

Para juiz esse trabalho pode, horror


Juízes que autorizam trabalho infantil ignoram realidade


Alex Rodrigues,
Agência Brasil


Brasília - Os juízes estão expedindo autorizações sem saber o que realmente está acontecendo com as crianças, diz o chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do Ministério do Trabalho, Luiz Henrique Ramos Lopes. Procurado pela Agência Brasil para falar sobre as mais de 33 mil autorizações de trabalho concedidas pela Justiça para crianças a partir de 10 anos, entre 2005 e 2010, Lopes é categórico: “É uma situação ilegal que afronta à Constituição e regularizada apenas pela opinião dos magistrados”. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Agência Brasil – Como o Ministério do Trabalho e Emprego avalia as autorizações de trabalho que juízes e promotores concederam a crianças com 10 anos ou mais?
Luiz Henrique Ramos Lopes – É uma afronta ao que a Constituição Federal estabelece em termos de proteção integral à criança e ao adolescente. A legislação é muito clara: o trabalho é proibido para quem tem menos de 16 anos, com exceção dos menores aprendizes. É preocupante quando vemos um juiz, um magistrado dar uma autorização para que uma criança e um adolescente comece a trabalhar a partir dos 10 anos, com a justificativa de que sua família é pobre e, portanto, não tem condições de se sustentar. Isso é transferir para a criança a responsabilidade por cuidar da família.
ABr – Para o Ministério do Trabalho, as autorizações judiciais têm amparo legal?
Lopes – Não. Para o ministério não tem. A Emenda Constitucional nº 20, que elevou a idade mínima para o trabalho de 14 anos para os 16 anos, está em vigor desde 1988 e, embora muitos juízes a considerem inconstitucional por ferir a cláusula pétrea que prevê o direito ao trabalho, não há qualquer declaração de que ela seja inconstitucional. As autorizações, portanto, são ilegais.
ABr – O que o Ministério do Trabalho tem feito para reverter a situação e sensibilizar juízes e promotores?
Lopes - O combate e a erradicação do trabalho infantil nunca estiveram ligados unicamente à fiscalização. Por isso, agimos articuladamente com outras instâncias de governo. No caso dessas autorizações judiciais, a rede de proteção está se mobilizando. Temos ido ao Conselho Nacional de Justiça [CNJ] e ao Conselho Nacional do Ministério Público [CNMP] para que haja uma posição vinda de cima para orientar os magistrados e promotores. Se o CNJ entender que as autorizações são ilegais e expedir resoluções [contra isso] nos ajudará muito.
ABr – Que prejuízos as autorizações trazem às crianças?
Lopes - A maior parte das atividades em que elas se encontram é insalubre até mesmo para os adultos e causa um prejuízo muito grande às crianças , porque elas são muito mais suscetíveis a doenças ocupacionais e a acidentes de trabalho.
ABr – Isso também traz prejuízo a atuação dos fiscais do trabalho?
Lopes – O impacto para a fiscalização é que ficamos de mãos atadas. Quando um fiscal chega a um local e verifica uma situação irregular, ele tem que afastá-la dessa situação. Diante de uma autorização judicial, não podemos agir. Já houve casos em que tiramos fotos da situação irregular para apresentá-la ao juiz que autorizou a criança a trabalhar. Ao ver quanto o local era insalubre e prejudicial à criança, o juiz disse não ter autorizado aquilo. Vemos que juízes estão dando autorizações aos patrões sem saber o que está acontecendo com as crianças.
ABr – Há alguma explicação para o crescimento do número de autorizações expedidas durante um período em que a economia nacional cresceu?
Lopes – Não há uma explicação técnica para isso, mas, de qualquer forma, os estados das regiões Sul e Sudeste são os que apresentam o maior número de casos. O aumento é constante e nos preocupa, principalmente porque não é um problema localizado, mas que atinge todas as unidades da Federação.

1 comentários:

Anônimo disse...

Funciona assim: se um homem de bem pede autorização para explorar o trabalho infantil, o juiz nem pensa muito, autoriza logo. Afinal, o solicitante é um homem de bem.

(ou, ao menos, um "homem de bens")