por Veronica Ferreira no SOS Corpo
O anúncio dos dois novos programas de saúde – SOS Emergências e Melhor em Casa – feito esta semana (dia 08 de novembro) pela Presidenta Dilma Roussef, estarreceu a todos(as) aqueles(as) que lutam pelo Sistema Único de Saúde, o SUS.
O Governo Federal lança mão da parceria com o setor privado, por meio dos grandes hospitais, para resolver os problemas de gestão e qualidade do atendimento das grandes emergências públicas. Em quase 10 minutos de seu pronunciamento em rede nacional, Dilma falou com entusiasmo da parceria com o setor privado. A palavra SUS não foi pronunciada em nenhum momento.
O anúncio acontece após semanas de campanha de desqualificação e ataque ao SUS pela mídia conservadora e privatista, e a menos de vinte dias da Conferência Nacional de Saúde, na qual representantes da sociedade civil, movimentos sociais, trabalhadores(as) e gestores(as) apresentarão suas propostas para a consolidação do SUS. O Governo escolheu a quem responder. Capitulou frente à pressão da imprensa conservadora e privatista e retirou da disputa na conferência uma de suas pautas mais importantes e tensas: a adoção do modelo das fundações privadas e OS's – organizações sociais, na gestão do SUS.
Nós, dos movimentos de mulheres, sabemos - e vivemos - os problemas no atendimento que roubam vidas, todos os dias, nas grandes emergências dos hospitais públicos. E dos problemas ainda persistentes na atenção básica e de média complexidade. Uma situação de barbárie que precisa ser enfrentada. Para isso, defendemos em nossas mobilizações e nos espaços de participação (conselhos e conferências) o investimento pesado de recursos nos hospitais públicos, a contratação de mais profissionais com condições de trabalho e possibilidades de realizar uma carreira pública plena no SUS, além da ampliação de unidades de alta complexidade e da qualificação no atendimento.
Isto é possível e pode ser feito pelo Estado, com investimento e gestão pública, pelos sujeitos que vêm construindo, há duas décadas, um dos maiores sistemas públicos e universais de saúde do mundo. O SUS é a prova de que isto é possível. Para isso, há que se optar por qual modelo de Estado e por qual projeto para a saúde queremos construir.
Para consolidar o SUS, evidentemente, é preciso recursos. E recursos não caem do céu, como disse a Presidenta em seus discursos. Isto já estava claro no processo Constituinte, que teve como uma de suas principais conquistas a definição de um orçamento próprio para a Seguridade Social, estabelecendo uma diversidade de fontes de financiamento. Os fundos públicos são disputados pelos interesses econômicos, razão pela qual a Constituição estabeleceu e protegeu o orçamento para os direitos sociais. O orçamento da Seguridade, tal como estabelecido na Constituição, nunca se realizou, por exemplo, a partir da taxação das grandes fortunas, do capital financeiro. O que ocorre, hoje, é o contrário. Os recursos da seguridade são levados para o “céu” do capital financeiro, para o pagamento infindo de juros da dívida, que não se paga nunca, para sustentar a política econômica de superávitprimário, para assegurar a credibilidade do País frente aos credores e investidores, digo, aosespeculadores do capitalismo financeiro internacional, que hoje dominam o mundo e subordinam estados nacionais a seus interesses.
O orçamento da Seguridade Social tem sido drenado, desde 1994, por meio da DRU – Desvinculação de Receitas da União, para o pagamento de juros da dívida pública e para sustentar a credibilidade internacional do Brasil junto ao grande capital financeiro. Os 45 bilhões de reais que o SUS precisa para garantir melhor qualidade, conforme o próprio Ministério da Saúde já estipulou, são desfalcados anualmente para pagar os impagáveis juros da dívida. Em 2012, o desfalque será de 62 milhões! E enquanto Dilma fazia seu pronunciamento, o Congresso nacional aprovava a prorrogação da DRU até 2015, sob pressão do Governo.
Para pressionar pela aprovação da DRU, o Governo lança mão em seu discurso do enfrentamento à pobreza. A pobreza tem sido acionada em muitos momentos para legitimar as ações do Governo, mesmo aquelas que claramente favorecem a concentração de riqueza. Como o volume de recursos retirado dos direitos sociais para o capital financeiro é um escândalo, o Governo sustenta que os recursos irão também para a construção de moradias, para o PAC e para o Programa Brasil sem Miséria. Ocorre que, para garantir os recursos do Brasil sem Miséria, não precisamos de DRU. Basta deixar as receitas onde elas já estão: no Orçamento da Seguridade Social, que inclui os recursos para a política de assistência.
Não queremos gestão privada do SUS, em nenhum nível – municipal, estadual ou nacional. Não aceitamos a prorrogação da DRU. Seguimos acreditando que um sistema de saúde público, universal, de qualidade, é possível. E que precisamos seguir realizando a revolução na saúde que o SUS representa, ainda inacabada. E também que, para isso, é preciso realizá-lo com recursos públicos, sob a gestão pública e o controle democrático da sociedade, a partir da experiência enorme e revolucionária que a implementação do SUS nas duas últimas décadas construiu.
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