quinta-feira, 23 de maio de 2013

Mulher cristã que sai de casa porque apanha do marido está pecando?

Mulher cristã que sai de casa porque apanha do marido está pecando?

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Foto: Renata Moraes / Reprodução Instagram
Foto: Renata Moraes / Reprodução Instagram
Sim, a dúvida é essa mesma que você leu. Quer que eu repita? Você acha que “mulher cristã que sai de casa porque apanha do marido está pecando?”
A pergunta, que pode soar bastante chocante para algumas pessoas como eu, foi lançada ontem à noite no programaVejam só”, da RIT.
Quem me alertou foi a Renata Moraes, que me mandou uma foto com a tela de sua TV e alguns tuítes. Segundo ela, uma pastora que participava da atração relatou, no ar, como havia aconselhado uma mulher espancada pelo marido a permanecer casada com o agressor. A ideia toda, claro, é trabalhar com a culpa e reforçar o papel supostamente determinado de submissão das esposas.
Havia também posições contrárias, é verdade. A atração se dedica cotidianamente a debater atitudes dxs fiéis que poderiam vir a ferir a moral cristã, o que implica diversos pontos de vista.
Mas a existência do questionamento em si já é um absurdo completo. Violência contra a mulher é crime. E ponto.
Segundo o artigo 5º da lei Maria da Penha, “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.
O texto também fala que “cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direito”.
Ou seja, uma pergunta dessas está indo contra a lei ao abrir a possibilidade de manutenção do sofrimento de mulheres que, muitas vezes, não veem uma saída para sua situação e recorrem à fé para ter respostas.
Além disso, uma questão desse tipo viola o artigo 221 da Constituição Federal, em que:
“A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:
I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;
III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;
IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.”
Não há nada mais anti-ético do que colocar em debate “se” uma mulher está pecando por fugir de uma situação de vulnerabilidade extrema. (E, antes que alguém venha dizer, não, respeitar os “valores da família” não inclui ser conivente com estupro, porrada e tortura psíquica).
Que a nossa TV está tomada por pregação religiosa não é novidade. Cada vez mais, aliás, a grade aparece repleta dessas atrações, que muitas vezes pagam uma pequena fortuna para as emissoras que as abrigam.
Não estou discutindo aqui a expressão da fé. A Globo exibe todo ano a Missa do Galo e isso parece amplamente aceito. O problema é colocar em dúvida a legitimidade dos direitos humanos. É um absurdo completo, um desrespeito absoluto às pessoas e põe em risco a integridade física das mulheres!
Não é possível que programas desse tipo permaneçam no ar sem qualquer regulamentação. O controle social e público dos meios de comunicação é mais do que urgente, é uma necessidade intrínseca ao desenvolvimento da nossa sociedade.

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1 comentários:

Onçana disse...

Eu estava zapeando os canais quando vi este absurdo. Primeiro fiquei chocada, depois fui tomada de grande raiva... poxa, como alguém que se diz religioso pode ser conivente com violência doméstica?
Se é pra debater pecado, por que não questionaram se era pecado o marido espancar a mulher? Ao menos faria algum sentido...